Livro: Negros, estrangeiros: os escravos libertos e sua
volta à África
Autora: Manuela Carneiro da Cunha
A nova edição, revista e ampliada, de Negros,
estrangeirosretoma um clássico sobre a história dos libertos no Brasil e das
relações Brasil-África no século XIX, bem como uma atualíssima discussão
antropológica sobre o conceito de identidade étnica. A primeira edição, de
1985, foi pioneira na análise das histórias de liberdade durante o período da
escravidão e fundamental nos estudos da presença brasileira na costa ocidental
africana, constituída por comunidades de libertos que haviam retornado.
Tratou-se igualmente de um marco nos estudos sobre a alforria e a situação
daqueles que, uma vez superada a escravidão, enfrentavam os limites que a
sociedade impunha ao exercício da liberdade alcançada.
O grande tema buscado pela autora, e encontrado nas
histórias de libertos que voltaram para a África, é o da construção das
identidades étnicas e o papel da cultura nesse processo. Ao debruçar-se sobre
as trajetórias de africanos que, uma vez libertos e de volta ao seu continente
de origem no século XIX, passaram a identificar-se como brasileiros, procurando
manter o português como sua língua e o catolicismo como sua religião, além do calendário
litúrgico-festivo brasileiro, Manuela deslinda um rico e complexo sistema de
formação de identidade étnica. Demonstra que essa criação não pode ser
entendida fora de seu contexto histórico e das relações dos grupos que criam
essa identidade com outros sujeitos sociais. E o faz com base em cuidadosa
pesquisa com utilização de fontes de época, além de entrevistas com
descendentes da comunidade de brasileiros na Nigéria.
O livro foi em muito enriquecido pela inclusão de belas
imagens de época feitas no Brasil e na África, além de fotografias de Pierre
Verger e da coleção pessoal da autora, referentes à comunidade de brasileiros
na Nigéria no século XX. Como ela própria reconhece, não atualizou a
bibliografia, que teve nas últimas décadas obras como as de João José Reis e
Milton Guran, além de Alberto da Costa e Silva. Ainda assim, as ausências não
comprometem a atualidade da abordagem e as questões que desperta, e toda sua
densidade se traduz numa linguagem acessível agradável.
Mônica Lima e Souza
Professora do Instituto de História da UFRJ e coordenadora
do Laboratório de Estudos Africanos
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