Negros representam menos de 1% dos novos médicos formados em
São Paulo. "Na minha sala, que tem 115 alunos, sou o único negro. Tenho
bolsa de estudos do Prouni e acho que as políticas de democratização do acesso
ao ensino ajudam, mas ainda são insuficientes", conta estudante de
medicina
Somente 0,9% dos cerca de 3 mil novos médicos formados no
ano passado no Estado de São Paulo são negros, revelam dados inéditos do
Conselho Regional de Medicina (Cremesp) obtidos pelo jornal O Estado de S.
Paulo. O número é inferior à média da população negra no Estado, de 6,42%,
considerando os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE).
O perfil dos egressos dos cursos de medicina do Estado foi
feito pelo Cremesp com base nos dados fornecidos pelos recém-formados no último
exame anual obrigatório do órgão, feito no fim do ano passado. As estatísticas
mostram ainda que a maioria dos recém-formados é mulher de classes sociais
altas.
De acordo com os dados do Cremesp, enquanto apenas 0,9% dos
novos médicos são negros, 85% se declaram brancos, quando a média dessa
população em São Paulo é de 63%. Na questão de gênero, 56,6% dos novos médicos
são do sexo feminino, número superior à proporção de gênero observada no
Estado, onde 51,3% da população é formada por mulheres, de acordo com dados de
2014 da Fundação Seade.
O levantamento revela ainda que 47% dos recém-formados nas
escolas médicas do Estado têm renda familiar mensal superior a 20 salários
mínimos, o equivalente a R$ 15.760. Na população geral de São Paulo, apenas 3%
dos moradores estão nessa faixa de rendimento.
Realidade
Para estudantes de medicina e profissionais já formados, o
baixo número de médicos negros e vindos de famílias pobres no mercado não
surpreende. “Na minha sala, que tem 115 alunos, sou o único negro. Tenho bolsa
de estudos do Prouni e acho que as políticas de democratização do acesso ao
ensino ajudam, mas ainda são insuficientes“, diz Renan Zaramella dos Santos, de
23 anos, aluno do 4º ano de medicina da Faculdade de Ciências Médicas da Santa
Casa de São Paulo, onde a mensalidade do curso é de R$ 4.800.
Médico residente no Hospital São Paulo e graduado na Escola
Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Alysson
Ferreira Batista, de 35 anos, afirma que sentiu o preconceito racial de colegas
e professores durante a faculdade e após a conclusão do curso.
“Era comum outros médicos se dirigirem a mim como se eu
fosse o técnico de raio X ou auxiliar de enfermagem, como se um negro não
pudesse ser médico“, conta Batista.
Cota
Presidente do Cremesp, Bráulio Luna Filho afirma que as
características e o preço de um curso de medicina aumentam essa desigualdade.
“É um curso muito longo, integral, que em média custa R$ 6 mil por mês. Isso já
é caro para a classe média, imagina para quem está na faixa mais pobre da população“,
diz ele, que defende a manutenção e ampliação das políticas governamentais de
financiamento estudantil e cotas.
Para Frei David, coordenador executivo da ONG Educafro, é
necessário rever as políticas de cotas em cursos de alta demanda. “Nesses cursos,
como Medicina, deve haver uma política de inclusão ainda maior, com mais vagas
para cotistas. Isso é necessário para corrigir uma distorção. Se formos
analisar a proporção de estudantes de cada cor nessas faculdades, é um Brasil
esquizofrênico, que não reflete a realidade do seu povo.”
UOL - Pragmatismo Político
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