"Amanhã está fazendo dez anos que ganhamos a eleição,
lembra?", foi logo me dizendo o ex-presidente Lula quando liguei para ele
na manhã desta sexta-feira (26) para cumprimentá-lo pelo seu aniversário.
O tempo corre tão depressa que já não me lembrava direito
daquele 27 de outubro de 2002, quando Lula comemorou no mesmo dia o seu
aniversário e a vitória nas eleições para presidente da República.
Como estamos novamente na antevéspera de uma eleição, Lula desistiu
de fazer neste sábado, em que completa 67 anos, uma comemoração para lembrar a
data da primeira vitória do PT.
Preferiu deixar para organizar com calma, no começo de
janeiro, uma série de atividades em que pretende fazer um balanço dos dez anos
de governo do PT (oito dele e dois de Dilma).
"Vamos discutir o que era o Brasil antes do governo do
PT e o que é agora", anunciou Lula, depois de voltar de mais uma longa
maratona de comícios pelo País.
Bastante animado com o que viu, e principalmente com a
dianteira que seu candidato Fernando Haddad abriu nas pesquisas para a eleição
de domingo em São Paulo, Lula já começou a fazer planos para 2014, sem citar
nomes. "Precisamos ter competência para montar uma chapa forte na disputa
pelo governo do Estado."
Desde que ele entrou de cabeça nas campanhas do PT, como
estava sempre em trânsito, não falava com o velho amigo. Em nenhum momento da
nossa breve conversa por telefone, o ex-presidente se queixou de qualquer
problema de saúde, o que demonstra que ele está recuperado do tratamento do
câncer na laringe, descoberto há exatamente um ano.
Até a voz está voltando ao normal. E combinamos de nos
encontrar na próxima semana para colocar os assuntos em dia.
* * *
Como já não me lembrava do momento em que ficamos sabendo da
vitória na eleição de 2002, recorro mais uma vez ao meu livro de memórias Do
|Golpe ao Planalto — Uma Vida de Repórter (Companhia das Letras), em que conto
o que aconteceu:
Às cinco horas da tarde do domingo 27 de outubro de 2002, no
dia em que Lula completava 57 anos, foi com muito custo que ele atendeu a meu
chamado para vir até onde já se encontravam sua família - a mulher Marisa, os
quatro meninos e as noras - e uns poucos amigos, diante do aparelho de
televisão (...).
A TV Globo iria anunciar o resultado da pesquisa
boca-de-urna da eleição presidencial. O âncora Franklin Martins chamou a
repórter, que estava ao lado do presidente do Ibope, Carlos Augusto Montenegro:
"Agora, ao vivo, vamos conhecer os resultados da pesquisa boca-de-urna com
a repórter Mariana Kotscho". Por uma coincidência, a repórter era minha
filha mais velha.
"Olha lá, Mara! A Mariana está mesmo com jeito de
grávida!": foi o primeiro e único comentário de Lula, como se o resultado
anunciado por Montenegro, dando-lhe a vitória por larga margem sobre José
Serra, não estivesse acabando de confirmar a primeira eleição de um operário
para a Presidência da República do Brasil, depois de três tentativas
frustradas.
As pessoas começaram a pular, gritar e se abraçar. Lula,
impassível, braços cruzados, olhava para o monitor de TV. Parecia não acreditar
no que via e ouvia - ou já esperava por aquele resultado havia muito tempo e
por isso não se surpreendeu. Os filhos, também; pareciam assistir ao final de
um jogo cujo resultado já conheciam. Com os números da pesquisa aparecendo na
tela, não tinha mais erro. A comemoração podia começar, mas o dono da festa
resistia. "Porra, Lula, nós ganhamos a eleição!", gritei, e lhe dei
um tapa nas costas, para ver se ele caía na real.
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