O resveratrol parece ser o grande responsável entre a
associação do vinho com a redução do risco de doenças cardíacas.
O paradoxo francês é uma expressão disseminada entre
nutricionistas para descrever a contradição entre a boa saúde cardiovascular da
população do país europeu e a sua gastronomia rica em gorduras e açúcares. Um
dos elementos que não falta na dieta deles é o vinho, usado tanto na preparação
de alimentos quanto para acompanhá-los. Agora, cientistas da China dão os
primeiros passos a fim de mostrar que essa bebida alcoólica exerce papel-chave
além das refeições. Um composto encontrado nela, o resveratrol, parece ser o
grande responsável entre a associação do vinho com a redução do risco de
doenças cardíacas, acreditam pesquisadores da Third Military Medical University
(TMMU), na cidade de Chongqing.
No estudo publicado recentemente na revista mBio, organizada
pela Sociedade Americana de Microbiologia, os investigadores realizaram uma
série de experimentos em ratos para determinar os efeitos protetores do
resveratrol contra a aterosclerose (o acúmulo de placas de gordura nas paredes
das artérias) e descobriram que o mecanismo estava relacionado a mudanças no
microbioma intestinal, o ecossistema formado pelos micro-organismos que habitam
o sistema gástrico das cobaias.
Nos últimos anos, pesquisadores descobriram que os diversos
organismos que moram no intestino dos homens desempenham um papel importante na
acumulação de placas de lipoproteínas de baixa densidade (LDL), também
conhecidas como colesterol ruim, dentro das artérias. Apesar de o resveratrol
já ser conhecido pelas propriedades antioxidantes, o modo que ele age no
sistema gástrico é um mistério. A partir do experimento chinês, descobriu-se
que esse composto inibe a produção da trimetilamina (TMA) pelas bactérias
intestinais. A TMA é necessária para a produção de N-óxido de trimetilamina
(TMAO), componente conhecido na literatura médica por colaborar com o
desenvolvimento das placas de colesterol.
“Nossos resultados oferecem novos insights sobre os
mecanismos responsáveis por efeitos anti-aterosclerose do resveratrol e indicam
que o microbioma intestinal pode se tornar um alvo interessante para
intervenções farmacológicas ou dietéticas a fim de diminuir o risco de
desenvolver doenças cardiovasculares”, disse Man-tian Mi, principal autor do
estudo e pesquisador do Centro de Pesquisa em Nutrição e Segurança Alimentar do
Instituto de Medicina Preventiva Militar da TMMU.
“A grande novidade desse trabalho é demonstrar como o
resveratrol age na flora intestinal. Esse composto, assim como outros
polifenóis, diminui as placas formadas pelo colesterol nos vasos sanguíneos,
impedindo a inflamação de veias e artérias, que, muitas vezes, pode levar ao
rompimento desses vasos”, complementa Marcus Bolivar Malachias, presidente da
Sociedade Brasileira de Cardiologia.
Os pesquisadores pretendem replicar em humanos os testes
realizados com roedores e chamam a atenção para o fato de que esse polifenol
natural não tem efeitos colaterais. Malachias, porém, sugere cautela. “Existem
muitos outros fatores, como a hipertensão e a predisposição genética, que estão
envolvidos no surgimento de um quadro de aterosclerose e não estão
necessariamente ligados à biota intestinal”, justificou o médico brasileiro.
Suplemento
O resveratrol também pode ajudar indiretamente o coração.
Ele potencializa os efeitos das atividades físicas, segundo pesquisadores da
Universidade de Alberta, no Canadá. Os cientistas submeteram dois grupos de
ratos a exercícios, sendo que um deles recebeu suplemento do polifenol. Depois
de 12 meses de testes, os roedores que ingeriram o composto apresentaram um
rendimento melhor em relação àqueles que somente se exercitaram.
“Ficamos animados quando vimos que o resveratrol apresentou
resultados semelhantes aos obtidos por meio de treinos intensos de resistência.
Vimos imediatamente o potencial desses benefícios e acreditamos ter descoberto
uma forma de ampliar os efeitos da atividade física com uma pílula do
composto”, explicou Jason Dyck, coordenador do projeto.
O artigo publicado no periódico Journal of Physiology,
editado pela instituição inglesa The Physiological Society, explica que o
composto serve como tonificante devido a sua ação antioxidante. Mas é
necessário parcimônia, ressalta Dyck: “Para obter a mesma quantidade que
estamos dando aos roedores, a pessoa teria de beber de 100 a mil garrafas por
dia”, explicou.
Integrante do Núcleo de Cardiologia do Hospital Samaritano
de São Paulo, Gustavo Trindade também recomenda cautela: “Apesar de existirem
muitos estudos sobre a ação do resveratrol, é necessário ter cuidado. Não
existe uma prova cabal de seus efeitos e suas propriedades. São experimentos
que mostram possíveis relações. Nós não podemos receitar para uma pessoa que
passe a beber vinho ou suco de uva, seja para evitar a aterosclerose seja para
melhorar seu condicionamento físico, porque não sabemos qual dose seria a
melhor para um ser humano”.
Droga dissolve o colesterol
Um composto utilizado na fabricação de medicamentos para que
eles sejam dissolvidos mais facilmente no corpo pode ser uma nova solução para
reduzir placas de gordura nos vasos sanguíneos. A partir de um experimento
realizado com ratos, verificou-se que a ciclodextrina, encontrada em vegetais
ricos em carboidratos, poderá ser utilizada no combate à aterosclerose.
Publicado recentemente na revista Science Translational Medicine, o estudo foi
encabeçado pela Universidade de Bonn, na Alemanha, e contou com colaboradores
de universidades e hospitais norte-americanos.
A obstrução do sistema circulatório devido à grande
concentração de lipídios é uma das causas mais comuns de ataques cardíacos,
acidente vascular cerebral, entre outras doenças cardiovasculares, que são a
principal causa de morte no mundo. A estimativa é de que, por ano, o infarto do
miocárdio responda por 29,4% de todas as mortes registradas no país. Porém, os
tratamentos atuais, como drogas para baixar o colesterol, só funcionam em
alguns pacientes. Cientistas de diversos centros de pesquisa buscam soluções
mais eficazes para essa limitação clínica.
Em testes em camundongos com aterosclerose, a ciclodextrina
conseguiu dissolver parte do colesterol e reduziu em até 45% as placas de
lipídios nas artérias, mesmo quando os animais foram alimentados com uma dieta
rica em gordura. A experiência revelou que o composto ativa o gene LXR no
fígado, aumentando capacidade de ação dos macrófagos, responsáveis por destruir
elementos estranhos ao corpo. Essas células do sistema imunológico também
devoram o colesterol e o devolvem ao fígado, onde ele pode ser transformado em
bile e escoltado para fora do corpo nas fezes.
Cautela
Apesar de a substância já ser utilizada em larga escala pela
indústria farmacêutica, os pesquisadores são cautelosos quanto à utilização
dela contra a aterosclerose. “No geral, parece valer a pena explorar a
ciclodextrina de forma terapêutica, embora muito cuidado deva ser tomado. Ela é
potencialmente boa, pois combina a redução do colesterol no sangue com a
dissolução do colesterol pré-formado em placas, mas essa opção ainda precisa
ser explorada em ensaios clínicos”, defendeu Elena Aikawa, bióloga vascular do
Hospital da Mulher em Boston.
Outro dificultador é que a ciclodextrina não é um composto
patenteável. Por isso, há poucas empresas farmacêuticas que queiram patrocinar
estudos clínicos necessários para o novo uso clínico do composto, segundo
Aikawa, mesma com a Food and DrugDrug Administration (FDA), órgão governamental
dos Estados Unidos responsável pelo controle de medicamentos, autorizando novas
aplicações.
Via - Estado de Minas
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