“Ouvi muita gente dizendo: ‘Como é que pode, né? O cara lá e
a imagem aqui; não dá pra acreditar!'”
Em 18 de setembro de 1950, uma multidão se reuniu em torno
de um pequeno televisor (Foto: Reprodução)
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Por David Arioch
No seu Jornalismo Cultural
O empresário Ephraim Marques Machado, de Paranavaí, no
Noroeste do Paraná, assistiu a inauguração da primeira estação de TV do Brasil.
No evento, viu de perto celebridades da Rádio Tupi que migrariam para a
televisão. A experiência foi tão marcante que o então jovem se apaixonou pela tecnologia.
No dia 18 de setembro de 1950, em meio a milhares de
curiosos de diversas partes do Brasil e do mundo, lá estava Ephraim Machado,
participando de um dos momentos mais célebres da história da televisão
brasileira: o nascimento da Tupi, de Assis Chateaubriand, que consagrou o
Brasil como o quarto país do mundo a ter TV.
“Eu não passava de um jacu que tinha um serviço de
alto-falante e saiu do mato para ir a São Paulo ver a inauguração da TV”,
conta, às gargalhadas, Machado. O empresário diz considerar esse dia como um
dos mais incríveis de sua vida, e ratifica tais palavras com brilho nos olhos.
Ephraim relata que jamais imaginou como seria o primeiro
contato com um televisor, objeto nunca visto, nem mesmo em fotografias. De
televisão, o pioneiro só tinha ouvido falar. “O impacto foi muito grande, tanto
para mim, quanto para outras pessoas. Ao meu lado, ouvi muita gente espantada
dizendo: ‘Como é que pode, né? O cara lá e a imagem aqui; não dá pra
acreditar!’”, relembra Machado.
Chatô, responsável por trazer a teledifusão ao Brasil
(Foto:
Reprodução)
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À época, o empresário supôs que o televisor fosse
simplesmente uma tela parecida com a do cinema. “Pensei também que um cara
abria ela. Não tinha nada disso. Por isso me surpreendi tanto”, revela.
Contudo, o susto de não foi apenas com o aparelho, mas também com o número de
pessoas presentes na inauguração. “Tive uma dificuldade tão grande pra entrar
no auditório que você nem queira saber. Tinha gente demais, muita gente mesmo,
afinal São Paulo é São Paulo”, comenta.
A experiência foi tão significativa que ele admite ter se
apaixonado instantaneamente pela televisão. Inclusive pensou em seguir o
caminho do comunicador que tanto admirava: Assis Chateaubriand, proprietário
dos Diários Associados. “É um sonho que gostaria de ter realizado. Fiquei muito
interessado no produto quando vi. Se naquela época eu morasse numa cidade com
potencial de uma metrópole, eu teria dado um jeito de montar uma estação”,
assegura.
Quando o governo brasileiro lançou o primeiro edital para
pleito de concessões, o pioneiro cogitou a possibilidade de enveredar pela
teledifusão. Segundo Machado, havia um bom patrocínio e também inúmeros
benefícios. Entretanto, depois de se inscrever para disputar o direito de
montar uma emissora, o empresário soube que firmas estrangeiras estavam
capitalizando o negócio no Brasil. “Não pude transformar meu desejo em
realidade porque vi que não tinha recursos o suficiente para competir com o
capital externo. Nunca gostei de sociedade, então desisti”, justifica.
Atraso para entrar no ar
A primeira emissora da TV Tupi, prefixo PRF-3, seria
inaugurada às 21h com o programa TV na Taba, mas problemas técnicos causaram
atraso de uma hora. “Entrou no ar e saiu do ar. Tudo isso porque a câmera às
vezes parava de funcionar. Mesmo assim foi um evento espetacular. Dava gosto
ver aquela minúscula telinha”, defende o empresário Ephraim Machado.
Uma das primeiras câmeras da TV Tupi; filme
precisava ser
revelado (Foto: Reprodução)
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Além de assistir ao vivo o primeiro programa televisivo,
comandado pelo emblemático Homero Silva, Machado viu de perto dezenas de
artistas que fizeram história no rádio, teatro e cinema, como Lolita Rodrigues,
Amácio Mazzaropi, Aurélio Campos, Walter Forster e Lima Duarte. “Fiquei
deslumbrado quando vi a Hebe Camargo e o J.B. Junior. Deram um rosto para
aqueles famosos que tanto ouvíamos na Rádio Tupi”, reitera.
A influência do rádio para a TV também foi explícita, tanto
que o pioneiro se recorda de ter visto o apresentador com uma folha de papel em
mãos, lendo tudo ao vivo. “Ele parecia não se importar com o que víamos”,
brinca o pioneiro, se referindo a um fato de uma época em que ainda não existia
videotape.
Tudo era filmado em 35 milímetros e depois o filme era
revelado, para então ser transmitido por uma emissora de televisão. A precisão
era algo tão distante da realidade na década de 1950 que a filmagem normalmente
era veiculada cinco dias depois.
Saiba Mais
A TV Tupi foi a primeira emissora de televisão da América
Latina
Todos os equipamentos usados na inauguração da TV eram de
origem americana – da Radio Corporation of America (RCA).
No dia do evento, o transmissor foi colocado no topo do
prédio do Banco do Estado de São Paulo.
O frei mexicano José Mojica, também cantor, foi a primeira
pessoa a se apresentar na TV.
Assis Chateaubriand foi proprietário do Diários Associados,
o maior conglomerado de imprensa do Brasil. As posses do comunicador incluíam
36 emissoras de rádio, 34 jornais, 18 estações de televisão, várias revistas
infantis, uma agência de notícias, uma editora, a revista O Cruzeiro e a
revista A Cigarra.
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