A juíza federal Marciane Bonzanini suspendeu liminarmente
todos os anúncios da campanha do governo federal sobre a reforma da
Previdência. A magistrada atendeu a uma ação civil pública protocolada por uma
série de sindicatos do Rio Grande do Sul. Para as entidades, além de não
informar sobre os direitos previdenciários e as mudanças propostas, o material
publicitário ainda se vale do desconhecimento da população e faz propaganda
enganosa, amparada em dados questionados por especialistas.
Os sindicatos alegam que a campanha violou o caráter
educativo e informativo e de orientação social, que deve pautar a publicidade
oficial dos órgãos públicos, “uma vez que difundiu mensagens com dados que não
representam de forma fidedigna a real situação financeira do sistema de
Seguridade Social brasileiro e que podem induzir à formação de juízos
equivocados sobre a eventual necessidade de alterações nas normas
constitucionais previdenciárias”.
Segundo os autores da ação, desde que enviou o projeto de
reforma ao Congresso, o governo iniciou uma ampla campanha publicitária,
veiculando mensagens “alarmistas” com o objetivo de propagar a ideia de que a
Previdência Social brasileira é economicamente inviável, de que haveria um
“rombo crescente” e um deficit intransponível e de que a proposta de emenda
constitucional seria a única forma de viabilizar a manutenção dos direitos
previdenciários, buscando, desta forma, apoio popular ao projeto.
De acordo com os sindicatos, a versão contida na campanha
publicitária é alvo de questionamentos por especialistas na área da Seguridade
Social, associações de classe e pesquisadores, os quais criticam as
metodologias de cálculo empregadas pelo governo, que resultam em números
negativos, e sustentam que existe a construção de um discurso do deficit a
partir da desconsideração de receitas e da inclusão de despesas estranhas à
proteção social no balanço da Previdência Social.
“Diante de uma relevante controvérsia científica sobre
fórmula de cálculos e de interpretação acerca dos elementos que compõem receita
e despesas da Seguridade Social, que levam a conclusões opostas sobre a
situação financeira da Previdência Social, o governo federal, ao invés de
promover o debate, a informação e a orientação social sobre os direitos
previdenciários e sobre as possíveis mudanças no sistema de proteção social,
com a intenção de ver implantada a reforma que julga necessária, promove uma
narrativa do caos, valendo-se da desinformação das pessoas sobre as fontes de
custeio e regras de gestão, incutindo medo e incertezas na população”, dizem.
Publicidade do partido no poder, com recursos públicos
Na sua decisão, a juíza afirma que, em todo o material da
campanha analisado, verifica-se que não se trata de publicidade de atos,
programas, obras, serviços ou campanhas dos órgãos públicos, com caráter
educativo, informativo ou de orientação social, como permite o art. 37, § 1º,
da CRFB.
“Trata-se de publicidade de programa de reformas que o
partido político que ocupa o poder no governo federal pretende ver
concretizadas. Ou seja, não há normas aprovadas que devam ser explicadas para a
população; não há programa de governo que esteja amparado em legislação e atos
normativos vigentes. Há a intenção do partido que detém o poder no Executivo
federal de reformar o sistema previdenciário e que, para angariar apoio às
medidas propostas, desenvolve campanha publicitária financiada por recursos
públicos”, escreve.
Para a magistrada, sem adentrar na análise dos diferentes
entendimentos acerca do tema e das afirmações utilizadas nos anúncios, a
campanha publicitária poderia ser realizada por um partido político para
divulgar posicionamento favorável à reforma, “desde que não utilizasse recursos
públicos”.
Na sua decisão, ela alega que os movimentos e objetivos
campanha, financiada por recursos públicos, prendem-se à mensagem de que, se a
proposta feita pelo partido político que detém o poder no Executivo federal não
for aprovada, os benefícios que compõem o regime previdenciário podem acabar.
“Diante dessa situação, entendo que fica configurado uso inadequado de recursos
públicos na campanha publicitária encomendada pelo Poder Executivo federal, não
legitimado pelo art. 37, § 1º, da CRFB, configurando desvio de poder que leva à
sua ilegalidade.”
Danos a princípio democrático
Conforme despacho da juíza, a campanha publicitária
desenvolvida, utilizando recursos públicos, faz com que o próprio princípio
democrático reste abalado, “pois traz consigo a mensagem à população de que a
proposta de reforma da Previdência não pode ser rejeitada e de que nenhuma
modificação ou aperfeiçoamento possa ser feito no âmbito do Poder Legislativo,
cabendo apenas o chancelamento das medidas apresentadas”.
“O debate político dessas ideias deve ser feito no Poder
Legislativo, cabendo às partes sustentarem suas posições e construirem as
soluções adequadas do ponto de vista constitucional e democrático. O que parece
destoar das regras democráticas é que uma das partes envolvidas no debate
político busque reforçar suas posições e enfraquecer argumentos diferentes
mediante campanha publicitária utilizando recursos públicos”, completa.
A juíza decidiu, então, suspender, em todo o território
nacional, os anúncios da campanha do Poder Executivo federal sobre a reforma da
Previdência nas diversas mídias e suportes em que vêm sendo publicadas as ações
de comunicação – televisão, rádios, publicações impressas, rede mundial de
computadores, outdoors e indoors instalados em aeroportos, estações rodoviárias
e em quaisquer outros locais públicos –, sob pena de multa diária de
R$100.000,00 em caso de descumprimento.
Via - Portal Vermelho
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