Por Luis Nassif
No GGN
Do filósofo Eduardo Giannetti da
Fonseca, liberal, ouvi a máxima de que os juros são altos porque o brasileiro
entrou na voracidade do consumo e não sabe poupar, preferindo se endividar sem
olhar a taxa paga.
De um economista de direita, em
um Congresso Internacional de Direitos Humanos em Belém, as críticas acerbas
quanto ao fato do pobre gastar dinheiro atrás de quinquilharias da classe
média.
De Frei Betto, de esquerda, que o
grande erro do governo foi ter proporcionado bens materiais e não espirituais
aos pobres.
De O Globo, sempre atento às
invasões bolivarianas, ao fantasma de Che, e ao supremo risco dos irmãos Castro
invadirem o Brasil, o endosso às teses de Frei Betto.
***
E aí se vê a geleia geral em que
se transformou a política brasileira. No Bolsa Família, Frei Betto critica o
caráter “compensatório”. O Fome Zero, na
versão idealizada por ele, era um “programa emancipador”, que primeiro daria
formação, montaria uma estrutura em torno de conselhos populares, organização
social, para depois premiar o pobre com o direito ao consumo.
Nada além do que organizações
como o Movimento dos Sem Terra (MST), ou Movimento dos Trabalhadores Sem Teto
(MTST) propõem, ou seja, uma organização à parte do mercado, com fundas raízes
ideológicas, ótimas para a organização de grupos sociais excluídos, temerária
como política pública.
Releve-se o sofisma de Betto –
que o governo deveria dar luz e saneamento em vez de renda familiar, como se ambas
as prioridades fossem conflitantes.
O programa Luz para Todos é um
sucesso amplo. O saneamento, uma frustração, mas por falta de competência
gerencial, não de vontade política.
***
Nos três casos – o liberal, o
esquerdista e o direitista – o mesmo preconceito em relação ao livre arbítrio
do cidadão e do mercado como elemento de inclusão social. Nos três casos, uma
posição profundamente elitista, um liberalismo de jabuticaba, que investe
contra princípios básicos do liberalismo para políticas sociais, que defende o
livre arbítrio do beneficiário de políticas compensatórias; um esquerdismo de
araque, que só concebe o tal do povo submetido a programas educativos; e um
direitismo em estado puro, para quem o povo é a ralé.
***
Sugiro aos três grupos os relatos
da pesquisadora da Unicamp, Walkiria Leão, sobre o poder transformador do
consumo – ela própria abrindo mão de seus preconceitos de esquerda contra o
consumo.
São relatos extraordinários sobre
a importância do “crédito” (de acredito) na vida das pessoas, a maneira como
saíram do anonimato e ganharam um perfil público, levando-as a se transformar
em outras.
Pobres que tinham até vergonha de
frequentar locais públicos, graças ao consumo se sociabilizaram, não apenas
venceram a fome e a insegurança financeira, mas ousaram novas profissões, novos
voos.
***
Betto tem uma diferença em
relação ao Bolsa Família: sepultou o seu Fome Zero, um conjunto de ideias
soltas, sem nenhuma amarração conceitual, sem capacidade de implementar
política alguma.
Em uma das críticas ao Bolsa
Família, em 2009, taxou-a de “projeto de poder”. Projeto de poder mambembe era
o Fome Zero, com sua visão missionária de emancipação.
São esses pobres, que se tornaram
classe média sem a tutela do Estado, que estão hoje empurrando o país para
frente, ao exigir melhoria nos serviços públicos, a volta do crescimento
econômico, a recuperação do sonho que aprenderam a sonhar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário