Conseguirá a 'vênus platinada' convencer o público – e a Justiça – de que 'não sabia' que seus sócios pagavam propinas a cartolas pela transmissão de jogos de futebol?
Ao noticiar o escândalo de corrupção internacional de
subornos no futebol que levou à prisão do ex-presidente da CBF, José Maria
Marin, o Jornal Nacional da TV Globo omitiu informações relevantes ao
telespectador.
A começar pelo fato de J. Hawilla ter sido diretor de
esportes da própria Rede Globo em São Paulo – tendo sido antes repórter de
campo – e já nessa época, começou paralelamente a comercializar placas de
publicidade em estádios. Ali nascia o empresário com forte ligação com a
emissora.
Em 2003 J. Hawilla fundou a TV TEM, sigla de Traffic
Entertainment and Marketing, que forma uma cadeia de TVs afiliadas da Rede
Globo no interior de São Paulo. As TVs de Hawilla cobrem quase metade do estado
de São Paulo: 318 municípios e 7,8 milhões de habitantes, alcançando 49% do
interior paulista. Entre as cidades cobertas estão, São José do Rio Preto,
Bauru, Sorocaba e Jundiaí.
A dobradinha Hawilla-Globo não para por ai. Foi também do
Grupo Globo que o empresário comprou, em 2009, o Diário de São Paulo. Ele já
era dono da Rede Bom Dia, de jornais em cidades da área coberta pela TV TEM.
Faltou também o JN noticiar que os negócios da Globo com
Hawilla que fazem parte da programação nacional da emissora. A produtora TV 7,
que é da Traffic, faz os programas Auto Esporte e o Pequenas Empresas, Grandes
Negócios, apresentados na Globo aos domingos, já há alguns anos.
Mas o que ninguém sabe e nem a Globo conta é que J. Hawilla
é sócio de Paulo Daudt Marinho, filho e herdeiro de João Roberto Marinho, na TV
TEM de São José do Rio Preto (SP).
João Roberto Marinho é um dos três filhos de Roberto Marinho
que herdou o império da Rede Globo. O próprio João Roberto é sócio de dois
filhos de J. Hawilla (Stefano e Renata) na TV TEM de Sorocaba (SP). Aliás a
avenida em São José do Rio Preto onde fica a TV TEM ganhou o nome de Avenida
Jornalista Roberto Marinho, em homenagem ao fundador da 'vênus platinada'.
No Jornal Nacional de quarta feira (27) , muito brevemente,
William Bonner citou a Globo, como se quisesse dizer aos espectadores:
"Não temos nada com isso". O jornalista leu: "A TV Globo, que
compra os direitos de muitas dessas competições, só tem a desejar que as
investigações cheguem a bom termo e que o ambiente de negócios do futebol seja
honesto". Assim seco, sem entrar em detalhes.
J. Hawilla foi condenado nos Estados Unidos por extorsão,
conspiração por fraude eletrônica, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça.
Os crimes foram cometidos na intermediação de subornos para cartolas da Fifa,
da CBF e outras confederações de futebol por contratos de direitos televisivos
e de marketing. Ele admitiu os crimes e, para não ir para a cadeia, delatou
quem recebia propinas e negociou pagar multa de quase meio bilhão de reais.
Entre suas operações mais comuns estão propinas pagas à
cartolagem dos clubes para intermediar a comercialização com emissoras de TV,
como a TV Globo, dos direitos televisivos de transmissão dos jogos.
Segundo o departamento de Justiça dos Estados Unidos, as
empresas de TV e de outras mídias pagavam à empresa de marketing de J. Hawilla,
que conseguia os direitos de comercializar as transmissões, e depois repassava
uma "comissão" aos cartolas.
As propinas acontecem há pelo menos 24 anos e envolveram
jogos da Copa América, da Libertadores da América e do torneio Copa do Brasil,
segundo os investigadores dos EUA.
Ao longo dos anos a maioria destes jogos no Brasil foram
transmitidos com exclusividade pela TV Globo, que cedia alguns jogos para a TV
Bandeirantes – mas sob limites rígidos – para livrar-se de acusações de
concentração econômica e práticas anti-concorrenciais.
Se até o momento de fato não há acusações contra emissoras
de TVs que tenham chegado ao conhecimento público, também é difícil afirmar que
não pesam suspeitas. A Justiça dos Estados Unidos e o FBI disseram que as
investigações estão apenas no começo.
Todo mundo tem direito à presunção de inocência e ao
benefício da dúvida, mas depois de passar anos fazendo jornalismo na base da
pré-condenação, testes de hipóteses, "domínio do fato" e do "ele
não sabia?" para tentar fazer política demotucana, será difícil convencer
o telespectador de que a Globo "não sabia" que seus sócios pagavam
propinas a cartolas pela transmissão dos jogos que a emissora transmitiu.
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