Por Renato Rovai, em seu blog:
Lennon disse numa música, e Dilma poderia repetir: “Do jeito
que as coisas estão, vão acabar me crucificando.”
Está na moda crucificar Dilma.
A direita bate nela. A esquerda bate nela. E é curioso:
poucos meses atrás, ela foi reeleita com 54 milhões de votos.
Em meio a uma campanha sanguinolenta da mídia, ela se
reelegeu. Os eleitores entenderam que ela merecia um novo mandato.
Na educação, excluídos chegaram em número inédito às
universidades. Na saúde, o programa Mais Médicos levou assistência a dezenas,
centenas de milhares de brasileiros que jamais viram um consultório.
Na economia, o Brasil manteve-se firme, com índices
baixíssimos de desemprego, enquanto uma crise furiosa abalava potências como
Estados Unidos e Alemanha.
Na área social, milhões de brasileiros saíram da miséria
graças a programas de assistência.
Como tudo pode ter mudado tão rápido?
É difícil entender à luz da racionalidade. No discurso de
ontem, por exemplo, que vem sendo atacado por todo mundo, de Caiado a Luciana
Genro: o que ela disse de errado?
Serra escreveu que, com a fala, Dilma convocou as pessoas
para o protesto de 15 de março.
Mas o que justifica essa visão de Serra?
Dilma, no pronunciamento, situou a crise do Brasil como algo
que se insere num universo em turbulência.
A imprensa disse que ela “culpou” a crise internacional, mas
isto é uma falácia. Dilma colocou o Brasil no mundo, simplesmente.
Numa economia globalizada, quem prospera quando há uma crise
generalizada?
Ninguém. A China vai crescer metade do que vinha crescendo
nos últimos anos. A Rússia vai decrescer 5%, sem que ninguém atribua a Putin o
retrocesso e fique batendo em panelas.
Qual o ponto aí, então?
A rigor, Dilma jogou mais luzes, no assunto, do que a
imprensa porque esta, ou por inépcia ou por desonestidade, parece desconsiderar
que as coisas estejam complicadas em toda parte.
Em relação ao ajuste, Dilma fez uma analogia que o DCM,
meses atrás, já fizera.
Quando você está gastando acima de suas possibilidades, uma
hora você tem que se ajustar nas despesas.
Acontece numa família, acontece numa empresa, acontece num
país.
Agora: é importante notar que cada ajuste é diferente do
outro. Na Abril, onde participei de vários ajustes como diretor de revistas e
de unidades de negócios.
Eu evitei sempre cortar no conteúdo e nas pessoas. Campanhas
de marketing podiam ser postergadas. Pesquisas caras podiam ficar para adiante,
quando as coisas melhorassem.
Isso quer dizer o seguinte: você tem como administrar
ajustes.
Ah, mas o Levy é um ortodoxo. E daí? Levy, sob Aécio,
cortaria determinadas coisas. Programas sociais, provavelmente.
Sob Dilma, ele tem que se adequar às prioridades dela. Dilma
reafirmou, no discurso, seu compromisso com os menos favorecidos.
Até aqui, não há dado nenhum que sustente a ideia de que
esteja sacrificando quem menos pode.
Ela atentaria contra sua própria história e contra o futuro
de seu partido. Como o PT poderia pensar em ganhar em 2018 se os eleitores que
fizeram a diferença agora se sentissem enganados por Dilma?
O que existe, aparentemente, é uma imensa neurastenia, pela
esquerda, e uma monstruosa mobilização golpista, pela direita.
No meio disso tudo, está Dilma.
O jogo nem começou, e já a tratam, absurdamente, como uma
derrotada.
Mesmo os que, cinicamente, falam na corrupção. Quando se
combateu a corrupção como agora?
Antes, a direita, malandramente, dava foco total em
corrupção quando um governo popular se instalava no poder.
Escândalos reais e sobretudo imaginários tomavam o
noticiário para sabotar administrações inimigas. Foi assim com Getúlio, Jango,
Lula e Dilma.
Depois, como que por milagre, a corrupção desaparecia da
imprensa. Pesquise a corrupção no regime militar noticiada pela Globo.
Agora, com a lista de Janot, você tem na rede acusados não
apenas de um partido, o que é um avanço espetacular.
Porque significa o fim da hipocrisia, um passo essencial
para coibir corruptos e demagogos que sempre se tiveram na conta de
inalcançáveis.
Onde, então, as razões de tanto desagrado com Dilma?
Minha suspeita é que a cobertura matadora que a imprensa dá
a Dilma tenha, paradoxalmente, intoxicado a esquerda que abomina essa imprensa.
Espremida entre os dois lados, Dilma, como Lennon na canção,
tem que lutar para não ser crucificada.
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