Homem que capturou Ernesto 'Che' Guevara revela como foram
os últimos momentos de um dos líderes da Revolução Cubana e quais foram as suas
palavras finais. Guerrilheiro argentino foi executado por ordens dos governos
boliviano e norte-americano
“Eu valho mais para vocês vivo do que morto”.
Foi a frase completa que ele me disse, relembra, quase
cinquenta anos depois, o ex-general do Exército boliviano Gary Prado. Na época,
era comandante da companhia de forças especiais responsável pela operação que
prendeu o guerrilheiro em outubro de 1967. A luta do argentino Ernesto Guevara
de la Serna, mais conhecido como “Che”, estava acabada.
No dia 3 de novembro de 1966, Che Guevara chegou à Bolívia.
Um dos líderes da triunfante revolução cubana de 1959, inspiração de militantes
mundo afora, escapava da burocracia boliviana com a identidade de Adolfo Mena
Gonzáles. Escondia-se pelas ruas de La Paz como um homem de negócios uruguaio
em missão para a OEA (Organização dos Estados Americanos).
Estava em missão para uma ideia de mundo. Para uma América
Latina independente dos dólares que assombravam o Palacio Quemado, de onde
comandava o presidente boliviano René Barrientos, mas que não chegavam ao povo.
Assim como fez quando foi ao Congo, uma determinação inconsequente o levou à
Bolívia sem ser chamado — convencido de que, com sua presença, viria o apoio
para que a luta armada triunfasse também em território boliviano.
Os impulsos guerrilheiros eram calculados em mapas e planos
perfeitos que culminavam numa sociedade igualitária. A Bolívia era um local
estratégico para abrigar uma base guerrilheira no continente americano — dali
teriam apoio as revoluções que florescessem ao seu redor. Teria o apoio do
Partido Comunista da Bolívia, além da China e da União Soviética.
Mas o mundo real era grande demais para caber na tecnologia
rudimentar de um combatente latino-americano. Em janeiro de 1967, sem resposta
positiva do partido comunista local, muito menos de parceiros estrangeiros, Che
e os vinte e poucos combatentes do ELN (Exército de Libertação Nacional) se viram
sozinhos. E seguiram mesmo assim para o interior da Bolívia.
O acampamento vermelho foi erguido pelo ELN em Ñancahuazú,
no Chaco, o semi-árido boliviano, e vagou, por vezes errante, pela inexplorada
região. Com algum êxito nos dois primeiros meses — diante da morte, comemoravam
um passo à frente sobre homens sacrificados do Exército. Quanto mais mortos
fardados maior a determinação da tropa oficial de capturar os terroristas. A
cidade de Vallegrande ficou alvoroçada ao receber a base de operações do Exército.
Gary Prado foi testemunha e algoz do inimigo derrotado,
ferido, que outrora discursava no palanque da ONU. Certificou-se de que vivo
permanecesse o prisioneiro e voltou à área de combate contra os sobreviventes.
Os troncos das árvores do Chaco eram alvejados pelas rajadas trocadas, e os
estalares dos tiros assustavam os animais.
“Montamos uma operação com a qual conseguimos cercar o grupo
guerrilheiro e praticamente exterminá-lo, sobrando apenas dois guerrilheiros,
um deles, Che Guevara”, relata Prado, em entrevista exclusiva à Agência Plano.
As mãos que seguraram os rifles subversivos e as canetas que escreviam diários agora estavam atadas. Não podiam fazer mais do que agarrar o pequeno fiapo de vida que Che pronunciava a seus algozes: “Valho mais vivo que morto”. Não viveria, de qualquer forma, tempo suficiente para ver erguer-se o sonho pelo qual foi condenado.
“Sei que você veio para me matar. Atire, covarde, você só vai matar um homem”, dissera Che na ocasião.
Assim que capturado, o célebre prisioneiro foi levado ao povoado de La Higuera, onde passou a noite de 8 de outubro dentro da única escola da região. Nos derradeiros momentos agoniava estar preso em uma escola, encarcerado em uma sala onde crianças da região poderiam ler o primeiro alfabeto, talvez algum dia sua própria história que o sargento Mario Terán, severo mestre ao entrar na sala, se dispunha a por fim.
Não adiantavam mais quaisquer planos mirabolantes que sobreviventes do ELN pudessem tramar para salvar o líder. Na manhã de 9 de outubro de 1969, ao encarar o prisioneiro de 39 anos, Terán tinha a autorização de seus superiores, bolivianos e norte-americanos, para fuzilá-lo.
“Quando voltei a La Higuera, ao meio-dia, fui informado que Che havia sido executado por ordens do governo. Foi uma execução sumária”, lembra Prado.
Via - Pragmatismo Político
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