“Perde-se a vida, ganha-se a batalha!” ou “Ganha-se a vida,
perde-se a batalha!”. Do Capítulo LV, de “D. Casmurro”, de Machado de Assis.
No referido capítulo do romance de Machado, o protagonista e
narrador Bentinho hestia entre os dois finais do soneto que pretende escrever.
E que, no final, não o faz. Em suma, o soneto, quando menos, perdeu ambos, a
vida e a batalha.
Mutatis mutandis, é uma situação hoje enfrentada pelas
esquerdas brasileiras, sobretudo, as extremas. Que não gostam do PT. Que nunca
gostaram do PT. Que se desiludiram com o PT. Enfim, tudo.
A dúvida cruel, de bastidor, porque inconfessa, pode assim
ser resumida: o governo Temer é fraco (e é); o governo Dilma também é e será
fraco, se houver uma nova volta; melhor combater um governo Temer fraco e
ilegítimo do que um governo Dilma fraco mas legítimo; então vamos por panos
quentes numa possibilidade da volta de Dilma; a volta dela está ficando ligada
à ideia de um plebiscito sobre a antecipação das eleições; então, se esta a
fórmula para ela retornar com força, menos que mínima, somos contra. O resto,
convenhamos, é silêncio. Porque tal não se diz. Fica nas entrelinhas. Nas
linhas se diz que o plebiscito é duvidoso, pode legitimar o golpe, pode abrir a
porta para uma derrota das esquerdas… etc.
Aí chovem desdobramentos, sendo o principal o de que
poderemos (as esquerdas) perder as eleições e assim abrir espaço para um governo
legitimamente eleito fazer as barbaridades que este quer fazer, sem
legitimidade.Esta linha de argumentação incorre no erro histórico de setores da
esquerda em 1964. Estes setores consideravam que o golpe era uma quartelada de
pernas curtas; que logo os militares se viriam compelidos a devolver o poder
aos civis; e que, assim, o afastamento de Goulart e dos trabalhistas era uma
bênção histórica, pois liberaria os trabalhadores do jugo populista e os
lançaria nos “Caminhos da liberdade”.
Este tipo de análise esquece uma premissa importante: nem
sempre quem está no Palácio está no poder, e vice-versa. Veja-se o caso
brasileiro: quem está no Planalto é Temer e sua tropa. Mas quem está no poder
é, já agora, um conluio entre:
- o general do Gabinete de Segurança Institucional;
- seus contatos no Instituto Millennium e na mídia golpista;
- contatos em alguns ministérios, setores do funcionalismo
insatisfeitos com o governo, etc.
- o ministro da Justiça, que foi a Curitiba visivelmente
para convencer Moro a voltar a agir;
- De certo modo, o próprio Moro, dotado de superpoderes
judicias e que continuará fazendo o que quiser contra os petistas.
- Além disto, devem fazer parte deste núcleo do complô um
bando desconhecido de contatos internacionais - não mais através das sinistra
CIA, mas através destas redes de ONGs, siglas e contra-siglas, que fornecem
matéria prima para os agentes brasileiros.
- Este grupo deve manter contatos constantes entre si, para
manter sua hegemonia sobre as decisões que vierem a ser adotadas.
O general do GSI foi investido de poderes capazes de driblar
o Ministério da Defesa. Vai a Israel fechar acordos relativos à segurança. Vai
investigar e cadastrar as esquerdas. Temer devolveu aos ministros militares
prerrogativas quanto a dados de carreira que Dilma havia retirado.Moro, depois
da visita do MJ, volta a agir, com os poderes absolutos de sempre. Manda
invadir casa de senadora sem mais aquela. E o STF faz o papel de vaquinha de
presépio.
Para este grupo, Temer foi um acidente de percurso. Poderá
ser mantido ou não. Se for mantido, é este grupo que ai redesenhar, com a Globo
e arredores, mais a Fiesp e suas contribuições, o futuro do Brasil. Não vai
haver complacência com relação às esquerdas.
Para este núcleo duro nada pior do que alguma forma de
consulta popular. O ideal seria já em 2017 votar uma emenda parlamentarista e
algo como uma eleição indireta para a Presidência da República.
Mas diante deste quadro, as esquerdas estão agora empenhadas
numa discussão interna. O curioso é que para algumas delas a consulta popular
parece tão ameaçadora quanto para o núcleo duro do golpe. Preferem enfrentar um
governo Temer - ou outro dele emanado - ilegítimo - do que correr o risco de
ver um governo Dilma retornar, mesmo que para comandar uma eleição antecipada.
O plebiscito parece uma ameaça: podemos perder! Sim, podemos perder, mas eu
diria que nesta altura é a única arma institucional que temos para se contrapor
a avalanche do núcleo duro do golpe. Além de que, parece, somente ele poderia
abrir uma possível porta para a derrota do impeachment no Senado. Sem este
apoio institucional, iremos de manifestação em manifestação até a perda de
fôlego. E aí a direita realmente reinará. Com ou sem seus trouxinhas a
tiracolo, pois eles terão se tornado dispensáveis.
Não vejo saída sem o plebiscito. Só entrada, mais uma e de
vez, num longo túnel chamado golpe. Trata-se aqui de ganhar a vida e a batalha.
Via - Blog do Miro
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