Este texto faz parte da série Heróis da América, que aborda
jogadores, treinadores e dirigentes que fizeram história nos países
latino-americanos, mas que nem sempre são bem conhecidos por aqui.
Selo homenageia Dittborn
após sua morte
|
Filho de um diplomata, Dittborn nasceu no Rio de Janeiro em
1924, seis anos antes da realização da primeira Copa do Mundo. Ainda criança se
mudou para Santiago, onde estudou no Colégio Sagrados Corazones, escola que
formou futuros presidentes, empresários e escritores de prestígio. Seus estudos
tiveram continuação na Universidade de Notre Dame, nos Estados Unidos, onde se
formou em Construção Civil. Na década de 50, já consolidado como um
profissional bem-sucedido, passou a dedicar cada vez mais tempo à sua maior paixão: o futebol.
Após ocupar cargos menores, foi eleito presidente da
Universidad Católica em 1953, conduzindo o clube ao título chileno no ano
seguinte. Pouco depois assumiu a frente da Conmebol, sucedendo o conterrâneo
Luís Valenzuela. Nessa condição, viajou o mundo defendendo a candidatura
chilena para sediar o Mundial de 1962, projeto que tinha a concorrência de
Alemanha Ocidental e Argentina, postulantes mais poderosos e influentes.
Nada favorecia o sonho chileno – dentre os interessados, o
país era o mais pobre. Mesmo quando a Fifa oficializou que seu principal
torneio seria na América do Sul (após duas edições na Europa), as
possibilidades não aumentaram tanto. Os alemães desistiram, mas os argentinos
seguiam como favoritos: eles se preparavam para receber uma Copa havia mais de
20 anos, quando entraram na disputa para sediar a edição de 1934 e,
posteriormente, também a de 1942, cancelada por conta da Segunda Guerra
Mundial. Somente uma imensa reviravolta poderia mudar o destino do torneio.
Antes de discursar no Congresso da Fifa,
Dittborn viajou o mundo divulgando a
candidatura chilena.
|
Pouco antes, Raúl Colombo, representante da Federação
Argentina de Futebol, finalizou sua apresentação com uma promessa de efeito:
“podemos realizar o Mundial amanhã mesmo porque já temos tudo”.
Dittborn tomou a palavra na sequência e, em tom bastante franco, reconheceu que o país vizinho estava mais avançado, a ponto de brincar com a afirmação anterior. O dirigente chileno teria dito: “porque não temos nada, faremos tudo”.
Dittborn tomou a palavra na sequência e, em tom bastante franco, reconheceu que o país vizinho estava mais avançado, a ponto de brincar com a afirmação anterior. O dirigente chileno teria dito: “porque não temos nada, faremos tudo”.
A clássica frase é contestada por alguns historiadores, mas
o poder da oratória daquele discurso não se questiona. Ele evitou comentar
sobre estádios e infraestrutura, porém falou de estabilidade política (a
Argentina havia passado por um golpe militar um ano antes) e exaltou as
qualidades da sua terra.
Contrariando a maioria dos prognósticos, ao final do dia o Chile recebeu 32 votos, contra 11 argentinos, além de 14 abstenções. O improvável aconteceu: então com apenas 6 de milhões de habitantes e pouca relevância internacional, o isolado país teria seis anos para “fazer tudo” e receber uma Copa do Mundo.
Contrariando a maioria dos prognósticos, ao final do dia o Chile recebeu 32 votos, contra 11 argentinos, além de 14 abstenções. O improvável aconteceu: então com apenas 6 de milhões de habitantes e pouca relevância internacional, o isolado país teria seis anos para “fazer tudo” e receber uma Copa do Mundo.
A princípio, os planos geraram desconfiança até mesmo na
população chilena. Ampliar a capacidade do Estádio Nacional de Santiago para 70
mil torcedores e construir novos campos no interior do país parecia muito
audacioso, mas, aos poucos, o projeto foi ganhando crédito à medida em que as
obras saíam do papel.
O espírito nacional era de grande euforia em 21 de maio de 1960, quando uma tragédia quase colocou tudo a perder.
O espírito nacional era de grande euforia em 21 de maio de 1960, quando uma tragédia quase colocou tudo a perder.
Terremotos no sul do Chile em 1960
estão entre os
maiores desastres da história
|
A prioridade nacional deixou de ser o futebol e a realização da Copa voltou a ser encarada como algo improvável.
Mas Dittborn conseguiu liderar uma nova reviravolta. Com sua
perseverança, recebeu uma doação de 20 mil dólares da Fifa e garantiu a
manutenção do evento, embora com programação totalmente reformulada.
Em meio a
destroços, Talca, Concepción, Talcahuano e Valdivia foram descartadas como
sedes, além das desistências de Antofagasta e Valparaíso, motivadas por
questões financeiras. A saída foi buscar o apoio dos municípios de Rancagua,
Viña del Mar e Arica, ainda em condições de se organizar em pouco tempo. A competição
seria menor, com jogos apenas na capital e três outras sedes, mas aconteceria.
Seleção chilena estreou no Mundiial
com tarja preta abaixo do escudo
|
Muitas homenagens ainda viriam depois. Os filhos de Dittborn
içaram a bandeira nacional na cerimônia de abertura e o uniforme da seleção
teve uma tarja preta abaixo do escudo no primeiro jogo.
O estádio de Arica, um dos construídos para o torneio, foi batizado Carlos Dittborn e uma copa amistosa disputada entre Chile e Argentina por 14 anos também recebeu seu nome.
O estádio de Arica, um dos construídos para o torneio, foi batizado Carlos Dittborn e uma copa amistosa disputada entre Chile e Argentina por 14 anos também recebeu seu nome.
Mais ainda, sua suposta frase no Congresso da Fifa permanece
até hoje enraizada na cultura chilena como palavras de motivação diante de
grandes desafios: “porque não temos nada, faremos tudo”.
*Diego Freire - Já escreveu profissionalmente sobre esportes para os portais Virgula e Terra, mas mudou de área e hoje mata as saudades do futebol colaborando com o UD. Tentou (sem sucesso) criar uma torcida do Linense na Austrália e teve a honra de escrever sobre Copa do Nordeste enquanto acontecia a Copa do Mundo 2010.
Nenhum comentário:
Postar um comentário