O lado obscuro da alma do blogueiro sente uma satisfação
mórbida quando se materializam desgraças que os que sabiam que o golpe era
golpe avisaram que sobreviriam. Apesar de que estar certo, nesse caso,
significa que você também vai se dar mal, é analgésico saber que as hordas de imbecis
que se fantasiaram com camisetas amarelas também pagarão alto preço.
Claro que muitos dos fascistas que inundaram as ruas pedindo
golpe contra Dilma Rousseff serão, sim, beneficiados por medidas contra os
trabalhadores que decorrerão da derrubada do governo eleito em 2014. São os que
têm motivos para apoiar o golpe por serem beneficiários de medidas contra
trabalhadores que o golpista Michel Temer já anunciou que tomará.
Porém, quase todos os camisas-amarelas que ajudaram a jogar
o Brasil nesse buraco vão se dar tão mal quanto quem não queria o golpe, porque
a quase totalidade dessas hordas de descerebrados é empregada de alguém, por
mais que ocupe cargos mais altos nas empresas.
Os camisas-amarelas ajudaram a colocar no poder um grupo
político identificado com grandes empresários que têm forte interesse na piora
das condições de trabalho dos assalariados. Essa gente começou a se animar a
pregar suas sandices durante o ano eleitoral de 2014.
Benjamin Steinbruch, presidente da Fiesp (Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo), diretor-presidente da CSN (Companhia
Siderúrgica Nacional) e do Grupo Vicunha, participou do programa de web TV
Poder e Política, da Folha e do “UOL”, conduzido pelo jornalista Fernando
Rodrigues. A gravação ocorreu em 25.set.2014 no estúdio do UOL em São Paulo.
Para resumir as loucuras que aquele sujeito pregou, basta um
trecho de sua entrevista:
Fernando Rodrigues – O problema do custo do empregado para o
empregador está relacionado diretamente aos direitos que os empregados têm.
Como é possível reduzir o valor que se paga para ter empregado sem reduzir os
direitos que lhe tem hoje?
Benjamin Steinbruch – Por exemplo, se você vai hoje em uma empresa
nos Estados Unidos, aqui a gente tem uma hora de almoço, normalmente não
precisa de uma hora do almoço, porque o cara não almoça em uma hora. Você vai
nos Estados Unidos você vê o cara almoçando com a mão esquerda e operando…
comendo o sanduíche com a mão esquerda e operando a máquina com a direita, e
tem 15 minutos para o almoço, entendeu? E eu acho que se o empregado se sente
confortável em poder, eventualmente, diminuir esse tempo, porque a lei obriga
que tenha que ter esse tempo?
É óbvio que isso não existe. Não é desse jeito que acontece.
E mesmo que fosse verdade, nos EUA a jornada de trabalho é menor e os salários
são muito maiores. Mas, como o leitor irá conferir adiante, esses dementes
dessas entidades ligadas à indústria pegam uma exceção em países ricos que
oferecem excelentes condições de trabalho e a transformam em regra.
Na imagem abaixo, cena das mais de duas horas de reunião na
última sexta-feira entre o presidente interino Michel Temer e cerca de 100
empresários da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Ao lado de Temer,
Robson Braga de Andrade, presidente da entidade. Temer e Braga de Andrade
concordaram em adotar “mudanças duras” tanto na Previdência Social quanto nas
leis trabalhistas.
Uma das “mudanças duras” discutidas pelos dois filhos das respectivas mães diz respeito à jornada de trabalho dos brasileiros. O presidente da CNI sugeriu que o Brasil adote iniciativas similares às que teriam sido adotadas pelo governo francês, que, sem aval do Parlamento, teria conseguido aprovar jornada laboral de até 80 horas semanais e/ou 12 horas diárias.
Abaixo, a pregação textual de Braga de Andrade, da CNI. Vale
informar que antes de jogar a bomba na praça, o presidente daquela entidade
empresarial discutiu o assunto com o presidente interino da República.
“Vimos agora o governo francês, sem enviar ao Congresso
Nacional, tomar decisões com relação às questões trabalhistas. No Brasil, temos
44 horas de trabalho semanal. As centrais sindicais tentam passar esse número
para 40. A França, que tem 36 passou, para a possibilidade de até 80 horas de
trabalho semanal e até 12 horas diárias de trabalho. A razão disso é muito
simples. A França perdeu a competitividade de sua indústria com relação aos
demais países da Europa. Agora, está revertendo e revendo suas medidas, para
criar competitividade. O mundo é assim e temos de estar aberto para fazer essas
mudanças. Ficamos ansiosos para que essas mudanças sejam apresentadas no menor
tempo possível”.
A proposta caiu como uma bomba, na sexta-feira. Como sempre
ocorre nas redes sociais, a loucura proposta pelos dois “presidentes” (da CNI e
da República) acabou virando piada, já que não havia meio de discutir
seriamente o verdadeiro genocídio social que está em gestação.
O mais engraçado é que, apesar de a declaração do presidente
da CNI – que, não se esqueça, foi acordada com Temer – jamais ter sido omitida,
diante da repercussão estrondosa e do surto de indignação que sobreveio, a CNI
entendeu que divulgando a íntegra daquela declaração alguma coisa mudaria.
Confira a nota da CNI divulgada para “negar” a proposta
clara de aumento drástico da jornada de trabalho dos brasileiros.
Parece brincadeira, mas é sério. O que a nota de “esclarecimento” da CNI mudou? Não está claro que o presidente da entidade acha que é aceitável um aumento tão drástico da jornada de trabalho dos brasileiros?
O mais preocupante, porém, é que Michel Temer e o tal Robson
Braga de Andrade estão absolutamente equivocados. Não houve mudança alguma na
jornada de trabalho dos franceses. O que houve foi uma autorização do governo
francês para que, em situações muito especiais (que serão descritas a seguir),
a jornada de trabalho possa chegar a 60 horas, não a 80.
Em primeiro lugar, vale informar que a legislação
trabalhista francesa estabelece jornadas de trabalho 35 horas semanais, e não
36 – no Brasil são 44 horas semanais.
Sites que se dedicam a apurar informações incorretas
divulgaram que o que a nova lei trabalhista francesa estipula é que, apenas em
casos de emergência e após negociação com sindicato, as horas extras poderão
chegar às tais 12 horas (oito horas, com quatro horas extras pagas em cinco
dias da semana; isto é, 60 horas).
Caso contrário, continua valendo o máximo de 10 horas (oito
horas, com, no máximo, duas horas extras, no mesmo período). No Brasil, a soma
dessas horas é semelhante.
A nova legislação francesa também reafirma que, “durante a
mesma semana, a duração máxima do trabalho é de 48 horas” e que “o tempo de
trabalho semanal calculado ao longo de 12 semanas consecutivas não deve exceder
48 horas”, exceto em casos de exceção previstos na lei.
José Carlos de Carvalho Baboin, mestre em direito do
trabalho pela Sorbonne e pesquisador do tema na USP (Universidade de São
Paulo), explica que a jornada máxima a ser permitida passa a 60 horas semanais,
porém essas horas extras são exceções previstas em decretos e aplicáveis apenas
em circunstâncias excepcionais.
“São casos extremos nos quais o governo francês vai permitir
12 horas semanais. Por exemplo: acontece uma grande nevasca e a empresa
responsável por limpar as estradas cheias de neve precisa que os trabalhos
excedam as 10 horas. Ou desabastecimento de algum remédio ou em caso de surto
epidêmico”, explica.
Isso significa que, para poder demandar essa jornada de 60
horas, o empregador vai precisar de autorização de uma autoridade
administrativa responsável pela inspeção do trabalho, que concederá essa
permissão com base em condições determinadas pelo Conselho de Estado da França.
Essas 60 horas não podem ser usadas por uma empresa que fechou um contrato com
um cliente e precisa aumentar a produção, por exemplo.
O decreto em questão, no entanto, ainda não foi expedido,
então não se sabe como funcionará de fato a regulamentação. Já as alterações na
lei devem entrar em vigor apenas no fim deste mês, portanto não há dimensão
factual do seu impacto.
O texto original do projeto de lei francês pode ser
conferido aqui e a discussão legislativa aqui. Reproduzimos, abaixo, os trechos
em questão, incluindo as exceções previstas na legislação.
Art. L. 3121-17. – La durée quotidienne du travail effectif
par salariéne peut excéder dix heures, sauf:
1° En cas de dérogation accordée par l’autorité
administrative dans des conditions déterminées par décret ;
2° En cas d’urgence, dans des conditions déterminées par
décret ;
3° Dans les cas prévus à l’article L. 3121-18.
Art. L. 3121-18. – Une convention ou un accord d’entreprise
ou d’établissement, ou, à défaut, un accord de branche peut prévoir le
dépassement de la durée maximale quotidienne de travail, en cas d’activité
accrue ou pour des motifs liés à l’organisation de l’entreprise, à condition
que ce dépassement n’ait pas pour effet de porter cette durée à plus de douze
heures.
Art. L. 3121-19. – Au cours d’une même semaine, la durée
maximale hebdomadaire de travail est de quarante-huit heures.
Art. L. 3121-20. – En cas de circonstances exceptionnelles
et pour la durée de celles-ci, le dépassement de la durée maximale définie à
l’article L. 3121-19 peut être autorisé par l’autorité administrative dans des
conditions déterminées par décret en Conseil d’État, dans la limite de soixante
heures.
Art. L. 3121-21. – La durée hebdomadaire de travail calculée
sur une période quelconque de douze semaines consécutives ne peut dépasser
quarante-quatre heures, sauf dans les cas prévus aux articles L. 3121-22 à L.
3121-24.
Aliás, vale informar ao distinto leitor que em nenhum lugar
do mundo essa jornada de trabalho é praticada. Conforme aponta estudo da OCDE
(Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), o país onde mais
se trabalha no mundo é o México, com 9,54 horas diárias; em segundo lugar vem o
Japão, com 9 horas diárias.
As médias de jornada revelam, inclusive, a quantidade além
da imposta pela legislação trabalhista dos países. Isso porque a Organização
Internacional do Trabalho classifica como “insalubre” qualquer jornada que
exceda a 48 horas semanais.
Segundo a Organização em seu estudo Duração do trabalho em
todo o mundo: tendências de jornadas de trabalho, legislação e políticas numa
perspectiva global comparada, a preservação da saúde dos trabalhadores foi um
ponto primordial para a adoção de um teto global de 48 horas no início do
Século XX.
Durante as últimas cinco décadas houve uma mudança global
para um limite de 40 horas. A evidência mais recente, em um estudo de 2005 da
OIT, mostra que esse limite é o patamar predominante no mundo.
“O limite de 40 horas, no entanto, não tem sido visto apenas
como um estímulo para a geração de empregos, mas tem sido reconhecido como
contribuição para um conjunto maior de objetivos, inclusive, em anos recentes,
o aprimoramento do equilíbrio trabalho-vida” – apontou a organização no
relatório.
Segundo a Organização, a extensão da jornada de trabalho
está intrinsecamente ligada à baixa produtividade e baixos salários, uma vez
que os trabalhadores precisam se utilizar de horas-extras para aumentar os
rendimentos.
Leia o relatório completo da OIT.
Enfim, esse episódio mostra o nível de desinformação dessas
entidades empresariais, os planos maléficos e antipopulares desses pilantras e,
o que é pior, a mentalidade assustadora do grupo político que governa o Brasil.
Diante dessa situação alarmante em que os grupos
antipetistas jogaram o Brasil, bem que as pessoas que perceberam aonde tudo
aquilo ia dar poderiam ficar isentas das medidas “temerárias” dos golpistas.
Que tal criarem um movimento que exija que só quem defendeu o impeachment seja
submetido às loucuras de Temer?
Poderiam criar um regime de trabalho especial para quem quis
colocar Temer no poder. Os camisas-amarelas trabalhariam 80 horas semanais e os
cidadãos normais continuariam trabalhando 44.
Olhando a foto dos palhaços que foram endeusar os
empresários que querem a volta da escravidão, é difícil conter o riso. Aquele
pato para o qual os camisas-amarelas fizeram culto diante da Fiesp é, ou não, o
símbolo perfeito para aquelas hordas de imbecis que jogaram o país nas mãos de
psicopatas como Michel Temer?
***
PS: alguns bandidinhos de internet estão tentando vender que
os dois meliantes (Temer e Robson Andrade) que querem obrigar os trabalhadores
brasileiros a trabalharem 80 horas por semana não disseram o que disseram, de
modo que aí vai o vídeo [aqui] que mostra os dois apoiando essa loucura.
Via - Blog do Miro
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