O Brasil é um sujeito-nação de sorte por ter tido, do Pará
ao Paraná-pá, o cearense Belchior entre os seus!
A totalidade de Belchior sempre foi vivida com muita
angústia, rebeldia e juventude / Reprodução.
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Ricardo Prestes Pazello
Brasil de Fato
A data de 30 de abril de 2017 cai como um avião no meio da
metrópole chamada MPB. A partida de Belchior para outro plano faz do Ceará
sinônimo de Brasil; e podemos buscar em Belchior um pouquinho do Paraná.
Em 20 de setembro de 1979, por exemplo, ele era entrevistado
por Aramis Millarch, pesquisador musical paranaense. Era véspera da estréia da
peça “Rasga coração”, de Vianninha, em Curitiba, a qual concluía com a música
mais famosa do compositor cearense – “Como nossos pais”.
Na entrevista, Belchior menciona sua concepção de “canção”,
nem só poesia nem apenas som. A totalidade era o que lhe interessava. Dizia-se
influenciado por Décio Pignatari, poeta concretista, que, aliás, vivera a parte
final de sua vida na capital paranaense.
A totalidade de Belchior, porém, sempre foi vivida com muita
angústia, rebeldia e juventude. A poesia lancinante de seu canto torto,
paralela a linhas melódicas nem muito limpas nem muito leves, fazem de sua obra
uma ode à crítica social em todos os seus níveis.
Enquanto durou sua viagem nesse mundo, deixou suas marcas na
história de um Brasil que transitou da ditadura à reconstitucionalização.
Aliás, sua música “Pequeno Mapa do Tempo” o exemplifica, por ter sido
censurada, a ela se imputando crítica ao regime e aos exílios (por causa de o
poeta expressar seu medo de avião), bem como à realidade social do país. É nela
que encontramos o Paraná.
O rastro de Belchior deixado neste pequeno mapa é o do medo,
qualificado de Brasil. Um Brasil geral, de várias capitais. O poeta, assim,
volta ao tema de sua “Alucinação” – o medo da solidão e de sua violência. Por
isso, Belchior cita, para expressar seu medo, os nomes das grandes cidades
brasileiras na sua música. No meio delas, um “Paranapá”, meio Paraná, metade Paranapanema.
Portanto, um conflito de terras no meio do medo urbano já estourava na crítica
de Belchior: pá!
Na madrugada de 29 de abril (data histórica da lutas dos
professores paranaenses contra a repressão da democracia burguesa) para o dia
30, Belchior nos deixa, como um Concorde abatido pelo tempo. Mas se nesse ano
ele morreu, daqui para frente não morre mais. Mesmo abrindo a porta que dá pro
sertão da nossa solidão, o Brasil é um sujeito-nação de sorte por ter tido, do
Pará ao Paraná-pá, o cearense Belchior entre os seus!
Edição: Ednubia Ghisi
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