Segundo Costa, órgão indigenista está sob coordenação do
PSC, partido do deputado André Moura e indígenas correm perigo.
Ex-presidente da Funai não atendeu a pedidos de nomeação e
foi demitido do cargo / Mario Vilela / Funai
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Lilian Campelo
Brasil de Fato
Antônio Fernandes Toninho Costa ficou apenas quatro meses à
frente da presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai). Na última
sexta-feira (5), sua exoneração foi publicada no Diário Oficial da União.
Durante coletiva de imprensa, Costa denunciou que sua demissão foi motivada por
não ter atendido aos interesses políticos da bancada ruralista, que compõem a
base aliada do governo golpista de Michel Temer (PMDB).
“A minha exoneração é atribuída a fatores políticos, o
presidente da Funai deve defender as políticas indígenas, e foi isso que eu fiz
desde o primeiro momento”, afirmou.
O órgão indigenista é vinculado ao Ministério da Justiça e
Cidadania, pasta sob o comando de Osmar Serraglio (PMDB). Costa afirmou, no
entanto, que a pasta é dirigida pelo Partido Social Cristão (PSC), mais
especificamente pelo deputado André Moura (PSC-SE), líder do governo no
Congresso. O ex-presidente disse que não permitia “ingerências políticas” na
instituição e recebia pedidos de Moura para a nomeação de pessoas que, segundo
ele, não apresentavam nenhuma ligação com as causas indígenas.
“A Funai é composta de cargos técnicos de servidores
concursados. [Eu] jamais poderia deixar entrar nessa instituição pessoas que
não têm nenhum compromisso com as causas indígenas. A ingerência partiu
inicialmente do líder do governo e eu não atendi”, enfatizou.
Para o deputado federal Nilton Tatto (PT-SP) a demissão de
Costa da Funai não traz novidades, pelo contrário, integra a estratégia do
governo golpista de Michel Temer (PSDB) e sua base aliada de acabar com o órgão
indigenista.
“A demissão [Costa] vai no sentido de avançar naquilo que
eles [ruralistas] pedem que é a extinção da própria Funai e criar um outro
órgão. Não é novidade a demissão do presidente, que era nomeado por eles, mas
era alguém que tinha minimamente algum compromisso com os objetivos da Funai”,
pondera.
Honra
Costa assumiu o cargo no dia 12 de janeiro por indicação do
PSC. Na coletiva, porém, disse que não é filiado e que, segundo ele, trabalhava
como técnico assessorando o partido político.
“Eu não sou filiado a esse partido [PSC] e eu esperava que o
partido pudesse honrar aquilo que é o slogan ‘o ser humano em primeiro lugar’.
Foi para isso que eu vim, muito mais para defender as populações indígenas do
que defender partidos políticos. Talvez isso tenha contrariado o modelo que
estamos vivendo hoje, um modelo perverso, um modelo que prioriza as questões
políticas em detrimento do ser humano”, justificou.
O ministro da Justiça Osmar Serraglio se pronunciou por meio
de nota e declarou que a demissão de Costa se deve porque muitos assuntos não
estavam sendo tratados de forma urgente, como as demarcações de terras
indígenas. Serraglio declarou que “o governo tem o maior interesse em dar
prosseguimento aos processos”.
Durante a coletiva, Costa falou que os técnicos da Funai
“jamais deixaram de trabalhar” nas demarcações, mas os processos estão
“emperrados em decisões do Ministério da Justiça” e acredita “não haverá
evolução nesse sentido”.
Para o secretário executivo do Conselho Indigenista
Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, o indicativo do governo agora é colocar no
posto uma pessoa que facilite a subordinação do órgão indigenista aos
interesses dos ruralistas, o que irá agravar os conflitos. “Isso, na prática,
significará um agravamento ainda maior das condições de existência dos povos
indígenas”.
O governo ainda não anunciou quem assumirá o cargo, mas um
dos nomes cotados seria o atual diretor de Promoção ao Desenvolvimento
Sustentável da Funai, o general do Exército Franklimberg Ribeiro de Freitas. A
pasta entra novamente em disputa política que será decidida pelo PSC.
Índios isolados
Na avaliação do ex-presidente, a situação dos indígenas no
país ficará ainda mais difícil dentro do atual cenário político e com a postura
do Ministério da Justiça, alinhada ao governo golpista.
“Eu acredito que se não houver um despertamento do povo
brasileiro sobre o momento político que nós estamos passando, esse país vai
passar por momentos difíceis, porque os índios jamais arredarão de deixar os
seus direitos defendidos” disse. Ele também citou a situação dos índios
isolados que, sem um órgão que possa defender os seus direitos, ficarão muito
mais vulneráveis.
A situação também preocupa o secretário executivo do Cimi.
Buzatto aponta que, no país, 112 grupos de povos indígenas isolados já se
encontram em situação de vulnerabilidade, principalmente nas regiões onde as
Bases de Proteção Etnoambiental (FPE) da Funai foram fechadas, como no Vale
Javali, no Amazonas.
“Nós temos relatos dos próprios indígenas de fechamento de
bases na região do Amazonas, no Vale do Javali, onde há maior concentração de
povos isolados do Brasil e do mundo, são cerca de 14 povos isolados, naquela
região”, alerta. O risco, segundo Buzatto é de etnocídio das populações
originárias.
“O fechamento dessas bases em função do corte de recursos
financeiros por parte do governo Temer ao órgão indigenista agrava a situação
ao extremo, colocando esses povos todos sob riscos de serem eliminados,
extintos”.
Edição: José Eduardo Bernardes
Via – Brasil de Fato
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