Nos termos em que se pauta o governo Temer, o Brasil segue
condenado a repetir no presente o que se conheceu somente no passado distante:
o atraso do subdesenvolvimento e a exclusão avassaladora de muitos.
Por Marcio Pochmann*
O ciclo político da Nova República iniciado em março de 1985
com a ascensão do governo Sarney (PMDB, PFL e outros partidos) através do
colégio eleitoral da Ditadura Militar (1964 – 1985) se esgotou em maio de 2016
com a arbitrária ruptura do governo da presidente Dilma (PT, PMDB e outros
partidos), eleita democraticamente dois anos antes. Nestes 31 anos, o
predomínio de governos sustentados por ampla conciliação de classes se tornou o
principal sustentáculo da mais longeva experiência democrática registrada no
Brasil.
Com isso, o país conseguiu inovar, por meio da Constituição
Federal de 1988, que garantiu um avanço da cidadania e das bases das políticas
públicas de bem estar social jamais conhecido no país. O que não foi pouco,
considerando que o quadro trazido por séculos de desigualdade começou a ser
enfrentado, não obstante a ausência do crescimento econômico sustentado no
tempo gerador de estagnação da renda per capita.
Se no período de 1945 a 1980, por exemplo, a economia
nacional cresceu 7,1% como média anual, entre 1981 e 2016, a expansão média ao
ano caiu para apenas 2,1%. Mesmo assim, a desigualdade na repartição da renda
pessoal retroagiu ao que era em 1960 (índice Gini de 0,49), após ter alcançado
a 0,63 no regime autoritário, bem como diversos avanços sociais, econômicos e
institucionais.
Nas três últimas décadas, contudo, o mesmo arco de alianças
políticas afiançadoras dos governos eleitos democraticamente terminou por
impossibilitar a realização de reformas profundas na economia, sociedade e
instituições, conforme imaginadas pelos que lutaram na transição do antigo
autoritarismo para o novo regime democrático. E é isso que se pode concluir ao
reler as 119 páginas do documento Esperança e Mudança, de autoria do PMDB, que em
1982 defendia a transformação democrática e a nova questão nacional, a
estratégia do desenvolvimento social e as diretrizes da política econômica.
Em síntese, o documento era uma espécie de conexão com o
programa de reformas de base estabelecido pelo antigo PTB no governo João
Goulart (1961 – 1964) e que havia sido interrompido pelo golpe militar de 1964.
Buscava-se o futuro desapegado do passado.
Mas ao enterrar as bases democráticas da Nova República, o
governo classista de Temer abriu um novo ciclo político no país, ainda que não
se saiba por quanto tempo. De toda forma, a conformação de um bloco
liberal-conservador impõe o desmonte não apenas da Constituição Federal de
1988, mas também da chamada Era Vargas.
Enquanto o golpe militar de 1964 se apresentou reformista no
sentido da garantia do progresso econômico e da promoção do projeto de Brasil
grande, os golpistas de hoje apresentam-se regressistas na condução da
economia, cada vez mais exportadora primária, e apequenadora da presença do
país em termos internacionais.
Para piorar, a defesa do velho capitalismo selvagem pelo
governo Temer exclui os pobres do orçamento público, enquanto assiste ao avanço
da violência e do desgoverno da sociedade.
A desconstrução da federação frente à crise de estados e
municípios se acelera pela versão econômica propagandista da recuperação da
criação de empregos, negada constantemente pela própria realidade nacional.
Nesses termos, o Brasil segue condenado a repetir no
presente o que se conheceu somente no passado distante: o atraso do
subdesenvolvimento e a exclusão avassaladora de muitos.
*Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e
pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da
Universidade Estadual de Campinas.
Fonte: Rede Brasil Atual
Via - Portal Vermelho
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