Entidades ligadas à educação afirmaram, em audiência pública
no Senado, que querem ajudar a encontrar outras soluções para o país, e
criticam a falta de discussão por parte do governo.
Gleisi Hoffmann apresentou emenda à PEC 55, que congela os
gastos públicos por 20 anos
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Por Hylda Cavalcanti, da RBA
Reitores, representantes do Fórum Nacional de Educação
(FNE), sindicalistas, advogados, economistas, acadêmicos e representantes de
entidades da sociedade civil propuseram ao Executivo hoje (31), no Congresso,
que lhes seja permitido participar do debate sobre a Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) 55, que tramitou na Câmara como 241 – que congela gastos
públicos por um período de 20 anos. O objetivo da iniciativa, tomada durante
audiência pública que discutiu o tema no Senado, é propor alternativas que
possam ajudar a flexibilizar a matéria e evitar danos tão graves como os que
ameaçam o país, por meio das medidas a serem implementadas.
A audiência pública, realizada na Comissão de Direitos
Humanos e Participação Legislativa do Senado, contou também com a participação
de estudantes do movimento de ocupação das escolas. Mas apesar do gesto das
entidades no sentido de colaborar e ajudar, surpreendeu, mais uma vez, o fato
de terem sido convidados integrantes do governo e nem sequer um único
representante ter ido ao local – sem que tivesse sido dada qualquer
justificativa oficial para tal ausência.
“O Executivo deixou claro, novamente, que não quer debater a
proposta, que pretende trabalhar com sua base parlamentar estratégias para
aprovar a PEC o mais rápido possível sem muita discussão, como aconteceu na
Câmara. Mas aqui não deixaremos isso acontecer”, reclamou, logo no início dos
trabalhos, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR).
A senadora formalizou na mesa diretora da Casa, nesta
segunda-feira, uma emenda à PEC 55, condicionando sua aplicação, caso seja
aprovada no Congresso Nacional, a um referendo popular. “No caso de rejeição
pelo povo, esta Emenda Constituição não entrará em vigor nem produzirá
efeitos”, prevê o texto da emenda.
“Esperamos contribuir com uma discussão interna sobre a PEC,
que hoje é nossa preocupação maior. Sugerimos colocar especialistas dos
institutos e das universidades para apresentar contribuições. Queremos ajudar a
fazer com que a proposta melhore o país, mas sem limitar a educação”, afirmou
Wilson Conciani, reitor do Instituto Federal de Brasília, que representou o
Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional,
Científica e Tecnológica (Conif).
A representante do FNE Jaqueline Pasuch afirmou que o fórum
aprovou, durante sua última reunião, nota na qual diz que a proposta terá
enorme reflexo nos entes federados em relação ao cumprimento do Plano Nacional
de Educação e sugere outras alternativas. “O FNE propõe ao Executivo e ao
Congresso a revisão do marco tributário nacional para ampliar impostos sobre a
renda e o lucro dos que possuem maior patrimônio, em vez dessas medidas”,
ressaltou.
O professor Orlando Afonso, 2º vice-presidente da Associação
Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes),
considerou importante que a sociedade entenda bem os impactos da medida
proposta. Ele explicou que apesar das melhorias no ensino público e gratuito
nos últimos sete anos, ainda assim o Brasil está aquém dos outros países.
Segundo o educador, nesse período curto, o Brasil dobrou o número de matrículas
nas universidades federais e, mais do que isso, levou a educação superior ao
interior, num processo importante, mas que, a seu ver, “ainda está em curso”.
“Especialistas no mundo inteiro consideram que países com
até 15% de jovens na educação superior são considerados elitistas. E nós temos
hoje 17% de jovens na educação superior, só 2% acima deste percentual. As
consequências da PEC tendem a agravar ainda mais esse quadro”, contou.
Afonso destacou que o setor já possui um enorme desafio que
é recuperar o terreno perdido, nos níveis que o país exige. “Congelar os gastos
é condenar o país a ficar numa situação nada boa. Nos condenar à regra do
Índice Nacional de Presos ao Consumidor Amplo (IPCA) por 20 anos significa nos
manter no mesmo percentual de 17% de estudantes brasileiros cursando ensino
superior até 2036”, disse.
Wilson Conciani, do Conif, afirmou que até 1985 o país tinha
55 mil alunos em escolas técnicas e hoje esse número está em 1 milhão. Segundo
ele, nos países do hemisfério norte uma das metas principais tem sido incentivar
a educação profissional e aumentar o número de investimentos na área,
justamente para ajudar no desenvolvimento, ao contrário do que está pensando em
fazer o governo Temer.
“Além disso, saindo do ensino profissional, há os outros
danos que a PEC vai acarretar para os alunos que estão no ensino médio e nas
universidades”, disse.
Para Carlos Frederico Rocha, professor associado do
Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), retirar
os pisos de gastos na saúde e na educação é a única medida para a qual se
consegue reforma constitucional. Motivo pelo qual, em sua avaliação, a PEC vai,
sim, retirar direitos dos dois setores. “A educação deixará de representar
18,8% do Produto Interno Bruto (PIB), como representa hoje, para representar
12,8% do PIB em 2036. E isso sem contarmos a inflação”, explicou.
De acordo com a senadora Regina Sousa (PT-PI), o mais sério
na proposta é a forma com que estão sendo deixados de lado os programas sociais
em detrimento de projetos e interesses de setores empresariais.
Diretora da Confederação Nacional dos Trabalhadores em
Educação (CNTE), Rosilene Correa de Lima aproveitou para lembrar da greve geral
que está sendo organizada no país no próximo dia 11 para protestar contra a
proposta. “Temos acompanhado o movimento e o retrocesso que as medidas vão
acarretar nas políticas públicas. Por isso estamos conclamamos a todos. Essa
PEC dá um tiro no pé não apenas para a
Educação e na Saúde, como também é prejudicial para todo o setor público.
Precisamos reagir e mostrar o serviço que deixará de ser prestado como deve
ser”, afirmou.
Auditoria da dívida pública
O secretário-geral do Sindicato Nacional dos Docentes das
Instituições de Ensino Superior (Andes), Alexandre Carvalho, chamou a agenda do
governo Temer de “regressiva” e disse que as matérias em tramitação no
Legislativo precisam ser revertidas o quanto antes. “A Andes considera a PEC 55
absolutamente nefasta e estamos empenhados nas manifestações e protestos contra
a matéria”, acrescentou.
Carvalho propôs que seja solicitada uma auditoria sobre a
dívida pública do país, para que a partir da discussão sobre os resultados a
serem obtidos, seja retomada a discussão sobre a proposta.
Já o coordenador-geral da Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Estabelecimento de Ensino (Contee), Gilson Reis, disse que “a
PEC é tão draconiana que nem o Fundo Monetário Internacional (FMI) propôs
medida semelhante em qualquer país do mundo”.
“As únicas vezes em que a destinação de recursos para a
educação deixou de ser feita no Brasil foram em 1934, com a instalação do
Estado Novo, e em 1964, com o golpe militar. Embora o deputado Darcísio Perondi
(PMDB-RS), que foi relator da matéria na Câmara, tenha citado no seu parecer
que a Holanda adotou sistema parecido, o da Holanda foi muito diferente. Lá, o
congelamento foi feito por um período de quatro anos. Esta PEC precisa ser
muito bem analisada pela sociedade porque a perda social que representará será
enorme”, afirmou.
A estudante Nicole Moreira, de 15 anos, do colégio Santa
Felicidade, no Paraná, provocou os parlamentares da base aliada do governo, ao
perguntar se os senadores que estão dispostos a aprovar a matéria tiveram sua
formação em escola publica ou frequentam atualmente o sistema público de saúde.
Vanderlúcia de Oliveira, do Coletivo Nacional de Educação do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), também se solidarizou com o
movimento. Ela lembrou que o MST sabe o quanto o campo já foi injustiçado com
políticas educacionais e com a desigualdade social. “Sabemos o quanto
perderemos com a desconstrução de políticas sociais, principalmente o
fechamento de escolas públicas, depois da aprovação dessa matéria.”
“Viemos aqui participar desta audiência para apelar para o
bom senso dos senadores. Florestan Fernandes (sociólogo) já disse uma vez que
‘feita a revolução nas escolas, o povo a fará nas ruas’. Então que a façamos
nas ruas para impedir essas medidas”, conclamou a representante do MST.
Via RBA
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