O golpe na democracia brasileira viria para quebrar de vez
este movimento de crescimento de lutas classistas e de conquistas de direitos.
Como num cassino macabro, os grandes grupos financeiros
estão especulando e apostando abertamente no fim da democracia brasileira. Como
se noticiou no UOL, no jargão do mercado, a partir das manifestações
pró-impeachment do dia 13 de março e da avaliação de um iminente desmoronamento
da coalizão governista no Congresso Nacional, o “cenário-base” que prevê a
derrubada do governo Dilma estaria na ordem de possibilidade de 65 % a 75 %
entre os analistas de grandes instituições de consultoria financeira. O dólar
flutua para baixo e as bolsas para cima, ao sabor das especulações.
Provavelmente, os analistas internacionais e nacionais de
mercado diminuíram estes percentuais nos últimos dias diante da escala
grandiosa das manifestações do dia 18 de março em favor da legalidade
democrática, das turbulências e ilegalidades flagrantes que ameaçam a
legitimidade da Operação Lava-Jato e de uma renovada iniciativa do governo
Dilma na organização da resistência parlamentar (ver posições críticas ao golpe
do presidente do Senado, o racha iminente do PMDB, a disputa voto a voto na
comissão parlamentar que fará a primeira votação sobre a aceitação ou não do
pedido de impeachment).
O fato é que, após o editorial do New York Times do dia 18
de abril, o The Economist dá uma capa em favor do afastamento da presidente
eleita do Brasil. Não há mais dúvida que o capital financeiro internacional,
com sua força geo-política, está apoiando e organizando o golpe na democracia
brasileira.
Não é preciso se valer aí de nenhuma hipótese especulativa
de conspiração. Nestes tempos de espetacularização da política, os golpistas
não apenas deixam pistas, mas produzem símbolos midiáticos em série. Armínio
Fraga – o ex-ministro da Fazenda de Aécio Neves – apareceu em Brasília como o
terceiro personagem de um almoço que reunia Serra e Gilmar Mendes.
Em um artigo publicado nesta mesma Agência Carta Maior, em
dezembro de 2014, “Um escândalo chamado Armínio Fraga”, documentávamos a
presença deste homem de Wall Street e do grande banco norte-americano JP Morgan
como orgânico a toda estratégia do PSDB nas eleições. O PSDB havia migrado
definitivamente da condição de um partido da Avenida Paulista para Wall Street,
organizando um novo programa radical neoliberal de guerra aos direitos sociais
e de privatização do setor público brasileiro. Em março de 2014, Emy Shayo,
analista do JP Morgan, havia coordenado uma mesa entre publicitários conservadores
brasileiros com o tema “Como desestabilizar o governo Dilma?”.
No momento decisivo do final do primeiro turno das eleições de 2014, foi novamente o JP Morgan quem organizou um seminário de grandes banqueiros de Wall Street para ouvir Fernando Henrique Cardoso e sua diretiva de apostar as fichas em Aécio Neves e não em Marina Silva para a disputa do segundo turno.
No momento decisivo do final do primeiro turno das eleições de 2014, foi novamente o JP Morgan quem organizou um seminário de grandes banqueiros de Wall Street para ouvir Fernando Henrique Cardoso e sua diretiva de apostar as fichas em Aécio Neves e não em Marina Silva para a disputa do segundo turno.
Foi apenas em 1981, dezessete anos após o golpe militar, com
o trabalho de René Armand Dreifuss, no livro “1964: A conquista do Estado ( Ação
política, poder e golpe de classe)”, apoiado em ampla documentação resultante
de pesquisa em arquivos norte-americanos, que o caráter classista do golpe de
1964 foi ao centro das análise. Ele documentou as relações entre o IPES/IBAD e
os lobbies de financiamento americano para a eleição de deputados golpistas
desde 1962 até a campanha de desestabilização final do presidente Jango
Goulart. Certamente, as ilusões pecebistas sobre a existência de uma burguesia
nacional progressista dificultaram e retardaram este entendimento.
Hoje, para derrotar o golpe é preciso denunciar centralmente
o seu caráter patronal. A Fiesp, a Firjan, as Federações do Comércio de São
Paulo, a Associação Brasileira da Indústria Eletrônica e Eletrodomésticos (
Abinee), entidades empresariais do Paraná, Espírito Santo, Pará e muitas redes
empresariais estão já em campanha aberta pelo fim da democracia no Brasil.
Por que o capital financeiro e, cada vez mais, os grandes
empresários brasileiros estão movendo e se movendo em direção ao golpe?
Três razões
A primeira razão está bem enunciada no documento do Dieese
sobre o balanço das greves em 2013, uma dinâmica que prosseguiu em grandes
linhas até o final de 2014. Enquanto todos os olhos estavam voltados para as
espetaculares manifestações de ruas de junho de 2013, estava se registrando o
maior ciclo grevista de luta dos trabalhadores por seus direitos desde que a
série histórica se iniciou em 1978. Se em 2012 havia ocorrido em todo o país
877 greves, em 2013 esta dinâmica saltou para 2050 greves!. O número de horas
paradas que havia sido de 86.921 em 2012, saltou para 11.342 horas paradas em
2013, envolvendo dois milhões de grevistas. Pelo acompanhamento do Dieese, 80 %
dos movimentos grevistas obtiveram êxito! A forte ampliação do número de
grevistas, de greves e horas paradas, na avaliação do documento do Dieese,
correspondia a um desbordamento do centro para a periferia, das categorias
tradicionalmente mais organizadas para aquelas com menor tradição grevista, em
um quadro de menor desemprego e maior formalização do mercado de trabalho.
O golpe na democracia brasileira, viria, então, quebrar de
vez este movimento ascensional de lutas classistas e de conquistas de direitos.
A “eleição” de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, sob pressão do
mercado financeiro, revelou-se um instrumento instável, insuficiente e
inseguro. Seria preciso, por o governo do Brasil, com sua força, seu poder
repressivo e seu poder de agenda em choque frontal com o movimento classista
democrático dos trabalhadores.
A segunda razão está didaticamente exposta em um documento
do Diap, assinado por Antônio Carlos Queiroz. Ele elencou cinqüenta projetos de
lei anti-trabalhadores e anti-populares, racistas e machistas, em andamento no
Congresso Nacional que, em seu conjunto, desorganizam todo o sistema de
direitos democráticos previstos na Constituição de 1988 e acumulados pelas
lutas dos movimentos sociais desde então.
Entre eles, na Câmara Federal, a terceirização total das
relações de trabalho, a prevalência do negociado sobre o legislado e o
impedimento do empregado demitido reclamar na Justiça do Trabalho seus
direitos. Até a legislação que coíbe o trabalho escravo seria adulterada! No
Senado, a regulamentação e retirada do direito de greve dos servidores
públicos, a privatização das empresas públicas, a independência do Banco
Central. Estão previstas, a desvinculação dos recursos orçamentários de
porcentuais obrigatórios para a saúde e a educação pública, a desindexação do
reajuste anual do salário-mínimo em relação à inflação e ao crescimento do PIB,
a desindexação do piso dos benefícios previstos previdenciários e assistenciais
do valor do salário-mínimo. Seria iniciado, então, um novo ciclo de arrocho
salarial e de destruição das políticas públicas no Brasil.
A terceira razão é de ordem geo-política e econômica e diz
respeito à política externa soberana do Brasil, à política para os Brics, à
posição da Petrobrás no mercado mundial de petróleo, ao peso do Brasil no
recente ciclo progressista e distributivo das democracias na América Latina. O
golpe viria criar uma nova época de domínio norte-americano na América Latina,
impondo um novo cerco à revolução cubana em crise. Ao mesmo tempo, trilhões de
dólares do patrimônio do Estado brasileiro seriam colocados à disposição da
rapina do capital financeiro internacional.
Como alerta Antônio Carlos Queiroz, seria necessário após o
golpe criminalizar o movimento sindical brasileiro em larga escala, mais além
dos movimentos sociais. Não se aplica um programa tão radicalmente anti-popular
sem doses maciças de violência.
A assembléia dos quatro mil operários da Ford contra o golpe
, em São Bernardo do Campo , e a bela e decisiva reunião de Lula com lideranças
sindicais, de todo o país, de sete centrais brasileiras, neste dia 23 de março
vem estabelecer um novo marco na luta classista democrática contra o golpe dos
patrões.
Fonte: Carta Maior
Via – Portal Vermelho
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