Estou surpreso com uma nota publicada no Facebook da
Arquidiocese de Salvador (abaixo). Nela, Dom Murilo Krieger, primaz do Brasil,
não somente faz uma defesa contundente do posicionamento vigoroso da CNBB
(desta semana) contra a PEC 241 (agora PEC 55, no Senado), como vai além. Diz,
por exemplo, que "para o capital mundial, esta PEC é tudo o que ele
gostaria de ver aprovado. Os bancos, que já ganharam muito nos últimos anos,
vão ganhar ainda mais. Sobrará dinheiro para investirem na imprensa, dizendo que
esse sacrifício é mesmo necessário para o bem "do Brasil".
Dom Murilo pergunta: "Se a PEC 241 é tão boa assim,
porque seu conteúdo não foi colocado para a sociedade discutir? Por que foi
aprovada pela Câmara Federal tão rapidamente? (Alguém se lembra de outra
Proposta de Emenda à Constituição aprovada em tão pouco tempo?...)"
E o arcebispo de Salvador desafia: "chamar de marxista
quem pensa diferente de nós é o mesmo que condenar Jesus por ter dito aos
apóstolos, diante da fome da multidão: "Dai-lhes vós mesmos de
comer!" Se pensar nos pobres e nos que mais serão afetados pela PEC 241
for um gesto marxista, perguntemo-nos: O que fazer com o Evangelho e a Doutrina
Social da Igreja, dele consequente?"
Minha (grata) surpresa é porque o arcebispo de Salvador é
considerado um dos prelados mais conservadores da Igreja do Brasil.
Recentemente, por exemplo, ele explicitou sua insatisfação com um projeto de
reforma política encabeçado pela CNBB e o Movimento de Combate à Corrupção,
entre outras entidades. Quando foi nomeado para a primeira arquidiocese do
Brasil, em 2011, comentava-se tratar de uma estratégia do Papa Bento XVI para
reforçar a ala conservadora no país...
Há um imenso simbolismo num prelado que é primaz, ou seja, o
primeiro; da primeira diocese do Brasil, criada em 1551. Francisco, quando foi
eleito, disse que era simplesmente o bispo de Roma, o primaz da Igreja. Ser
primaz da Igreja no Brasil sempre foi um papel de destaque...
O que teria mudado na cabeça do arcebispo primaz do Brasil?
Lembro dia 20 de outubro, dom Murilo, juntamente com o
presidente da CNBB, Dom Sérgio (recém nomeado cardeal pelo Papa Francisco), e o
secretário da entidade, Dom Leonardo, estiveram reunidos com o Papa Francisco,
ocasião na qual o pontífice anunciou que não virá ao Brasil no ano de 2017
(foto acima).
Será que a conversa com o Papa foi importante para um
posicionamento mais claro e incisivo da Igreja no Brasil sobre o
recrudescimento de medidas governamentais e judiciais que atingirão
fundamentalmente a vida dos mais pobres e excluídos da nossa sociedade?
Vale a pena ler a nota na íntegra. E se surpreender, também:
"O Arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil, Dom Murilo
Krieger, scj, em apoio a nota publicada pela CNBB sobre a PEC 241, publicou as
seguintes observações:
Quanto às reações à NOTA DA CNBB PEC 241, aprovada pelo
Conselho Permanente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB, tenho
a dizer o seguinte:
1º - "Um ponto de vista, é a vista de um ponto!" O
Conselho Permanente da CNBB emitiu esta Nota consciente de que é preciso
alertar a Nação para os males da PEC 241. Procurou colocar-se, pois, do ponto
de vista dos mais necessitados e que mais sofrerão suas consequências. Se a PEC
241 é tão boa assim, porque seu conteúdo não foi colocado para a sociedade
discutir? Por que foi aprovada pela Câmara Federal tão rapidamente? (Alguém se
lembra de outra Proposta de Emenda à Constituição aprovada em tão pouco
tempo?...). Afinal, não se trata de uma Proposta qualquer, mas de uma proposta
de emenda àquele que é o nosso texto principal: a Constituição.
2º - Com a PEC 241 haverá limites para o investimento em
saúde, educação etc., mas não foi colocado limite algum para o pagamento dos
juros da dívida pública. Aliás, por que o Governo não faz uma auditoria da
dívida pública? Não fazendo, apenas repete o comportamento do Governo anterior
que, antes de ser eleito, falou muito da necessidade de fazer essa auditoria;
ficou no Governo 14 anos e nada fez. Vamos continuar assim, simplesmente
pagando juros?
3º - Para o capital mundial, esta PEC é tudo o que ele
gostaria de ver aprovado. Os Bancos, que já ganharam muito nos últimos anos,
vão ganhar ainda mais. Sobrará dinheiro para investirem na Imprensa, dizendo
que esse sacrifício é mesmo necessário para o bem "do Brasil".
4º - Chamar de marxista quem pensa diferente de nós é o
mesmo que condenar Jesus por ter dito aos apóstolos, diante da fome da
multidão: "Dai-lhes vós mesmos de comer!" Se pensar nos pobres e nos
que mais serão afetados pela PEC 241 for um gesto marxista, perguntemo-nos: O que
fazer com o Evangelho e a Doutrina Social da Igreja, dele consequente?
5º - Cada qual tem direito de pensar diferente; a própria
Nota incentiva o diálogo, que não tem havido. Peço apenas, aos que pensam
diferente do que está na referida Nota, que a guardem e a releiam daqui a 3 ou
4 anos...
Quem viver, verá.
Em Cristo Jesus,
Dom Murilo S. R. Krieger, scj
Arcebispo de Salvador
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