Eles chegam à América Latina buscando trabalho e esperança. Ninguém é devolvido a seu país, como ocorre com os milhares que tentam perigosamente chegar às costas da Europa
Embarque de espanhóis em 1890 (segunda onda); europeus
participaram da construção da nossa identidade
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Por Emir Sader
A primeira vez que chegaram aqui, vieram com a espada e a
cruz. Para dominar e explorar. Impuseram os maiores massacres que nossa
história viveu: a colonização, a dizimação das populações indígenas e a
escravidão. Deixaram legado monstruoso, pelo qual pagamos preço até hoje. Foram
expulsos pelas guerras de independência, mas ficaram heranças da sua primeira
visita.
A segunda onda foi muito diferente. Eram trabalhadores
imigrantes, que séculos depois vieram em busca de trabalho e melhores condições
de vida. Foram parte essencial na formação das nossas classes trabalhadoras,
trouxeram experiências de luta, ideologias populares, calor humano e cultura
para nós. Foram muito bem recebidos, vieram para ficar e ficaram.
Passou muito tempo e o movimento de migração mudou de
direção. Fomos nós a buscar melhores condições de vida por lá. Em países como a
Espanha foram centenas de milhares de latino-americanos, em particular
equatorianos e bolivianos, que foram fatores essenciais para o boom econômico
centrado na construção civil. Enquanto foram necessários, foram recebidos,
parte deles legalizados, em situação menos ruim do que os trabalhadores
africanos.
Quando chegou a interminável crise recessiva por lá, a
partir de 2008, os imigrantes começaram a voltar para seus países, até porque,
enquanto no Equador e na Bolívia a situação melhorou claramente, na Espanha os
imigrantes estavam entre os primeiros a pagar o preço da crise.
A partir dali começou uma terceira leva de imigrantes de lá
para cá. A Europa, um dos continentes mais ricos do mundo – porque acumulou
riquezas nos explorando, na sua primeira vinda para cá –, passou a exportar
gente. Veio uma nova leva de imigrantes expulsos pelo desemprego, pela
expropriação de direitos, pela recessão, pela falta de futuro.
A nova tendência da migração internacional: levas de
europeus chegam à América Latina buscando trabalho, melhores condições de vida,
esperança de futuro. São bem recebidos. Ninguém é devolvido para seu país, como
ocorre com os milhares que tentam chegar em precárias embarcações às costas da
Europa. A ninguém é negado documento, como o tiveram milhares de
latino-americanos que se submeteram a trabalhar em condições subumanas por lá.
Todos são bem recebidos, como são os haitianos, os sírios e tantos outros que
buscam refúgio e trabalho.
Quando havia centenas de milhares de equatorianos e
bolivianos na Espanha, houve uma manifestação de equatorianos reivindicando
documentos. Havia um cartaz com uma frase muito expressiva: “Estamos aqui,
porque vocês estiveram lá”.
Desta vez nós os acolhemos, como fizemos com os
trabalhadores imigrantes italianos, espanhóis e de outros países que vieram
ajudar a constituir a nossa classe trabalhadora. Hoje encontram países
diferentes, diminuindo a pobreza e a desigualdade, solidários, a receber
fraternalmente essa terceira leva de europeus que chegam por aqui
Via – Rede Brasil Atual
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