Francisco Fonseca considera ilegais e ilegítimas as manobras do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, para aprovar o financiamento privado de partidos
Há boas expectativas referentes ao STF, porque a maioria no
Supremo já havia vetado a PEC, no ano passado
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São Paulo – O professor e cientista político, Francisco
Fonseca, acredita que o Supremo Tribunal Federal tem em mãos a possibilidade de
resgatar o mínimo de democracia no Brasil se considerar inconstitucional a
Proposta de Emenda Constitucional que permite o financiamento privado de
campanha. Em entrevista hoje (9) para a repórter Marilu Cabañas, da Rádio
Brasil Atual, ele comenta o documento contrário à PEC elaborado por importantes
juristas brasileiros.
Fonseca afirma que as manobras do presidente da Câmara,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) são "autoritárias, truculentas e ilegais", e
que esse manifesto dos juristas apareceu em boa hora. "O próprio deputado
Marcelo Castro, que até então era seu aliado, já havia denunciado esse
processo. Agora, as assinaturas de juízes, a ida de 60 parlamentares ao Supremo
Tribunal Federal, coloca em questão a maneira de operar de Cunha, que não é
apenas ele em si. Ele representa o que tem de pior na vida política brasileira,
a privatização da vida pública, ele é recebe grandes somas de recursos
econômicos de grandes empresas. O que se espera é que o Supremo barre essas
manobras abertamente ilegais, e representam um atentado à democracia
brasileira.”
O professor lembra que o financiamento privado de campanha é
a principal fonte de corrupção entre políticos e empresas, e cita um protesto
ocorrido nos Estados Unidos contra a desigualdade econômica. "É aquilo que
chamam de plutocracia, que é o governo do capital. E que não é um fenômeno
apenas brasileiro. Eu me lembro do movimento Ocupe Wall Street, tinha como lema
que nós cidadãos comuns somos 99% e o capital é apenas 1%, e que domina Wall
Street. No Brasil, não é diferente, o capital capturou o sistema político
brasileiro e grande parte dos partidos, e hoje o STF tem a possibilidade de resgatar
o mínimo de democracia no Brasil."
Ele diz que possui expectativas positivas referentes ao
julgamento da ação movida pelos parlamentares para impugnar a sessão que votou
a constitucionalização da doação privada. "Eu acho que há uma
possibilidade de isso ocorrer, porque a maioria no Supremo já havia vetado –
com exceção bizarra do ministro Gilmar Mendes, que trancou seu voto por mais de
um ano, pedindo vistas –, sendo que a maioria absoluta já votou pela
contrariedade do financiamento privado de campanha. Há uma boa expectativa e o
papel dos juízes foi importante nesse sentido. O que se espera é que o Supremo
confirme e reverta integralmente a maneira que votou a Câmara. Mas pode ser
votado novamente, mesmo sendo derrogada, porque é uma Câmara conservadora. Mas
com a pressão social é possível que haja modificação."
Para o cientista político, há três grandes princípios que
devem ser levados em conta para fazer a reforma política. Os dois primeiros são
a desprivatização da vida pública e um sistema partidário mais representativo
("nós temos 32 partidos e grande parte não representa ideologias, sendo
uma fragmentação antipopular, um sistema pouco representativo do ponto de vista
político social, então, está errado do ponto de vista da democracia).
Um terceiro aspecto é o de transparência: "Ainda há uma
utilização desregrada de recursos públicos, contratos públicos que ainda não
são facilmente observados pela sociedade, enfim, é um ponto em que o Brasil
está avançado, mas é preciso avançar ainda mais. Como se traduzir num projeto?
Através de fidelidade partidária, com financiamento público, com formas de
impedir o uso oportunista de coligações proporcionais. É uma série de elementos
que tornam o sistema político eleitoral mais representativo, e mais controlável."
Continua o analista: "o Brasil precisa repensar
seriamente o sistema político-partidário. Hoje temos uma espécie de
parlamentarismo do capital. O poder Executivo perdeu a governabilidade, a pauta
não é do Executivo, mas sim do Legislativo. E é uma pauta extremamente
conservadora, contra a democracia, contra os pobres e a cidadania. É uma pauta
que não fala em (democratização da) mídia, por isso a mídia a apoia, pois não é
discutida a regulamentação dos meios de comunicação, para acabar com o oligopólio
de hoje."
Ao ser perguntado sobre a fala do líder do MTST, Guilherme
Boulos, que em entrevista à RBA afirmou que o PT "colhe o que deixou de
plantar", Fonseca concorda, mas diz que há tempo de reverter a situação.
"O PT não enfrentou a mídia, não enfrentou os bancos, e havia condição de,
no governo Lula, fazer uma reforma política. Não integralmente, pois não havia
forças, mas era perfeitamente possível melhorar o sistema político. O que o
Boulos diz é que não houve de fato um enfrentamento dos grandes poderes do
Brasil. O PT fez avançar muitos direitos no país, mas fez de uma maneira
tímida, e numa aliança de classes. Essa aliança se esgotou, como é visto agora,
quando a direita vai para as ruas. A grande questão que deixou de plantar é que
houve mudanças, mas não grandes transformações."
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