Caio Pacheco foi levado à delegacia após incômodo de
policiais com apresentação de espetáculo pró-desmilitarização.
Cerca de dez viaturas da Polícia Militar e da Guarda
Municipal de Santos (SP) interromperam uma apresentação do espetáculo BLITZ, da
Trupe Olho da Rua, na tarde deste domingo (30) e algemaram o ator e diretor
Caio Martinez Pacheco. Ele foi encaminhado o 1º Distrito Policial de Santos e
liberado no final da noite do mesmo dia.
O espetáculo de humor faz críticas ao militarismo e critica
abusos e mortes cometidas pela corporação. No momento da abordagem da PM, o
grupo apresentava a cena intitulada "Pacificação", na qual utilizam
uma bandeira do Brasil e do Estado de São Paulo invertidas. Parte do cenário e
adereços da companhia e celulares de espectadores, que filmaram a ação, foram
apreendidos pela PM.
A polícia registrou um boletim de ocorrência contra Pacheco
por desacato à autoridade e resistência à prisão, e o ator será autuado pelo
uso indevido de símbolos nacionais.
"Isso é absurdo. Hoje em dia os símbolos do país
estampam chinelos, roupa de praia, bolsa e qualquer tipo de mercadoria, mas
estamos cerceados de utilizá-los quando queremos formalizar uma crítica ao
Estado", criticou o diretor.
Ele pontua que o grupo pesquisa o tema da militarização há
mais de dois anos, o que sustenta a argumentação dos temas sobre o extermínio
de negros e periféricos e outras questões ligadas à repressão que o espetáculo
apresenta através do escracho. O roteiro do espetáculo foi montado em diálogo
com o Movimento Mães de Maio, que reúne, em busca de Justiça, mães cujos filhos
foram assassinados vítimas da ação do Estado.
Pacheco lembra que grupo já havia apresentado a peça na
mesma praça e, algumas das vezes, havia notado a presença da PM nos arredores,
mas nunca houve tumulto ou ameaça como nesta última apresentação. "Eles
quebraram todas as barreiras que garantem a liberdade de expressão",
afirmou.
Abordagem
A atriz e produtora do espetáculo, Raquel Rollo, conta que a
interrupção se deu por policiais "extremamente incomodados como o tema do
espetáculo". "Começamos a perceber que várias viaturas estavam
chegando. Um dos policiais chegou gritando que 'aquela merda ia acabar'. Eles
desceram com armas em punho, não só pistolas, mas submetralhadora",
relata.
Rollo considera a abordagem como uma "volta à
barbárie". "É muito complicado quando temos que debater com um
policial militar o que podemos ou não fazer dentro da arte, sendo que a nossa
liberdade de expressão e a utilização do espaço público estão garantidas na
constituição", criticou a atriz.
Além do ambiente político de "quebra de
institucionalidade" no âmbito nacional, Pacheco relaciona o fato a um
decreto de 2014 que entrou em vigor há três semanas no município e que regula a
utilização do espaço público e insere uma série de dificuldades burocráticas.
"Eles criaram várias situações envolvendo a guarda
municipal e os artistas e coletivos que ocupam as praças de Santos. Tudo isso
colaborou para que a polícia se sentisse no direito de tomar uma atitude como
essa, de interromper algo com que eles não concordavam", disse ele.
Contemplado para montagem de espetáculos inéditos pelo
Programa de Ação Cultural, o ProAC, em 2014, a Trupe Olho da Rua tem 15 anos e
já fez mais de 40 apresentações do espetáculo BLITZ - Um Império que Nunca
Dorme e agora entrará com a peça em cartaz em 17 cidades, após recursos de um
novo edital do governo estadual.
Em nota, o comando do policiamento da Baixada Santista
afirmou que pediu os registros documentais da ocorrência e analisará a conduta
dos policiais militares. Já a assessoria da Polícia Militar foi contatada por
e-mail pela reportagem, mas não se posicionou até o fechamento.
Edição: Camila Rodrigues da Silva
Via – Brasil de Fato
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